Matas cortadas ao meio pelo asfalto. Nascentes ilhadas por estradas. São muitos os obstáculos impostos pela malha rodoviária para a vida dos animais silvestres. Uma situação crítica sobretudo em Minas Gerais, maior malha viária do país, com 31.400 quilômetros.
Segundo o Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE), com sede na Universidade Federal de Lavras (Ufla), em 2022, mais de 20 mil animais de pequeno, médio e grande porte foram atropelados – média de 2,3 por hora.
No Brasil, a cada segundo, 17 animais silvestres morrem atropelados. O Sudeste é a região com o maior número, cerca de 56%. Uma das soluções tem sido a implementação de pontes ou túneis de fauna, que permitem aos animais cruzar de um ponto ao outro por cima ou por baixo do asfalto.
Em Brumadinho, um conjunto de soluções para preservar a segurança dos animais vem sendo implementada e pode servir de laboratório para outras vias.
Ações como a instalação de redutores de velocidade, placas educativas, passagens inferiores em forma de túneis, e superiores de fauna estão possibilitando a travessia segura de animais e a reconexão de áreas ambientais que foram impactadas pelo rompimento da Barragem B1, da Mina Córrego do Feijão, operada pela Vale.
O estudo de monitoramento da fauna atropelada e ações de mitigação de impacto faz parte do Plano de Controle Ambiental para implantação das obras de reparação no território de Brumadinho e do Plano de Reparação Socioambiental, integrante do Acordo de Reparação Integral assinado em 2021 pela Vale, Governo do Estado de Minas Gerais, Ministérios Públicos Federal e do Estado de Minas Gerais, e Defensoria Pública de Minas Gerais.
Ao todo foram instaladas dez passagens inferiores de fauna, túneis, e vinte passagens superiores ao longo de 60 km, o que possibilita a travessia segura dos animais. As estruturas são monitoradas por câmeras especiais que registraram ao longo dos últimos meses a utilização de diversas espécies silvestres como Gato-do-mato, Paca, Cachorro-do-mato, Saguis, Esquilos, Macacos-sauá, Mão-pelada, Onça-parda, dentre outras espécies.
Essas estruturas permitem manter a conectividade dos hábitats das espécies, conservar a biodiversidade, além de garantir a segurança de animais e usuários estradas. Entre setembro de 2021 e fevereiro deste ano, 8.162 animais foram registrados. Todas as atividades de monitoramento são frequentemente acompanhadas pelos órgãos ambientais competentes.
A maioria dos atropelamentos de fauna acontece à noite, por causa de hábitos noturnos de muitas espécies e a falta de visibilidade do motorista. Como cada espécie tem um padrão próprio de comportamento, há vários tipos de passagens. Algumas exigem estruturas de vias aéreas, outras subterrâneas, outras atravessam locais com a presença de água, árvores, entre outros. “As passagens de fauna estão possibilitando a travessia dos animais por baixo ou por cima das estradas e possibilitando a reconexão de ambientais florestais impactadas pelo rompimento”, destaca Gustav Specht, analista ambiental da Vale.
Gustav ainda ressalta que a presença de animais de diferentes níveis da cadeia alimentar é um forte indicativo que esses locais já estão desempenhando serviços ecológicos importantes, como a dispersão de sementes, a polinização, a fertilização de solo por meio de fezes, entre outros. “Com o passar do tempo as áreas em processo de recuperação formam uma espécie de corredor verde e ampliam as áreas florestadas que abrigam todo tipo de animal de Brumadinho e região”, diz.
O atropelamento de animais silvestres é uma das principais causas de perda crônica de fauna no Brasil. Para a Fernanda Abra, bióloga e pesquisadora do Centro de Conservação do Smithsonian Institution em Washington DC, Estados Unidos, o impacto dos atropelamentos pode interferir significativamente para o desaparecimento de diversas espécies.
“É uma questão que deve ser considerada em qualquer plano de recuperação ambiental ou projetos de mitigação em ambientes de transporte. À medida que as regiões se desenvolvem a malha rodoviária também cresce, o que influencia diretamente na dinâmica da fauna, o que é mais preocupante para espécies que já são ameaçadas de extinção. A implementação de medidas de mitigação, especialmente passagens de fauna são muito importantes. Vale destacar a necessidade do levantamento e acompanhamento de dados a médio e longo prazos para identificação dos pontos com maior número de acidentes e colisões, o que irá subsidiar as medidas de mitigação que devem ser tomadas”, ressalta.
Recuperação ambiental
Para a recuperação ambiental da área impactada pelo rompimento acontecer, o primeiro passo é a remoção dos rejeitos, atividade fundamental para apoiar as buscas realizadas pelo Corpo de Bombeiros. Somente após a liberação das áreas pelo CBMMG o trabalho é iniciado, já que a busca pelas pessoas desaparecidas é prioridade máxima desde o rompimento.
Até o momento, estão em processo de recuperação ambiental 42 hectares, incluindo parte da área diretamente impactada e áreas protegidas do entorno, com o plantio de aproximadamente 55 mil mudas de espécies nativas da região. Essa área equivale a 42 campos de futebol. Nesse processo de recuperação também está sendo feita a renaturalização de ambientes, incluindo a recuperação dos cursos d’água (ribeirão e córregos) e áreas úmidas impactadas.