Diga a seu pai que, se ele não pagar a pensão alimentícia, ele não vai mais ver você”. “Diga a sua mãe para usar a pensão alimentícia para você e não para ela”. No meio desse fogo cruzado estão crianças e adolescentes em sofrimento por conta da separação e da postura adotada pelos pais. É a chamada alienação parental, quando um genitor fala mal do outro para o filho e impede a boa relação entre eles. No ano passado, dobrou o número de processos no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) por conta dessa prática.
Foram 1.042 casos em 2017, contra 564 em 2016, somando todas as comarcas do Estado. Em Belo Horizonte, o índice também saltou de 110 para 222. Isso levando-se em conta só os processos que foram motivados pela alienação parental e cadastrados com esse título. Mas a prática é muito julgada também dentro de ações de divórcio e pensão alimentícia, segundo o TJMG.
Apenas divórcios consensuais foram 33.329 em Minas Gerais em 2016 (último ano pesquisado), aumento de 7% em relação a 2015, quando ocorreram 31.211. A média é de 91 separações por dia, sem contar as rupturas de uniões estáveis e de relações não formalizadas.
Oficina. Diante da alta demanda de rompimentos e do fato de os conflitos serem comuns entre casais nessa situação, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou uma cartilha para prevenir a alienação parental e propôs um curso aos tribunais, como já é feito em países como Estados Unidos, Canadá e Portugal.
O Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), do TJMG, em Belo Horizonte, promove a oficina Pais e Filhos. “O objetivo é tratar o fenômeno do divórcio e abrir espaço para as pessoas falarem sobre suas angústias”, disse a mediadora de conflitos e instrutora da oficina, Julieta Ribeiro Martins.
A oficina tem quatro horas de duração para cada família. O primeiro passo é explicar que a separação é um acontecimento comum e não extingue a família criada até ali. “O casal que teve filhos sempre se manterá conectado por meio deles e continuará compondo uma família. É preciso apenas se reorganizar e estabelecer uma convivência de diálogo e respeito”, ressaltou Julieta.
As crianças e os adolescentes também participam da oficina. “Eles convivem com outros na mesma situação e se livram da culpa pela separação”, completou a instrutora.
A fisioterapeuta Aline Ribeiro*, 44, tinha 38 anos quando engravidou do médico Simão Silva*, 50. A mulher contou que, durante a gestação, viveu uma relação abusiva de traições e de idas e vindas. Quando a criança tinha 6 meses, Aline deu um basta e acionou na Justiça para que o ex-companheiro assumisse suas responsabilidades como pai. Uma relação conflituosa que teria tudo para acabar em alienação parental. “A oficina ajudou muito, melhorou nosso diálogo”, disse.
* Nome fictício
Vagas para curso estão sobrando
Criada há quase quatro anos, a oficina Pais e Filhos já capacitou 796 casais em fase de separação. Só no ano passado, foram 222 adultos e 136 crianças e adolescentes. Mas o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) tem capacidade para receber ainda mais pessoas. A média por turma tem sido de 20 inscrições, sendo 30 o limite.
“Nosso objetivo é aumentar a procura para amenizar o sofrimento de famílias que estão passando por conflitos”, afirmou a mediadora de conflitos e instrutora da oficina, Julieta Ribeiro Martins. A maioria das pessoas que procuram o curso (90%) é encaminhada por um juiz de família durante processos de divórcio.“Queremos que as pessoas nos procurem antes do processo judicial para que resolvam a situação na base da mediação”, explicou Julieta. Quem tiver interesse pode entrar em contato com o Cejusc pelo telefone 3253-2164 ou pelo e-mail cejuscbhmediacao@tjmg.jus.br.
Programe-se para as próximas oficinas
Agenda. Em março, o curso ocorre nos dias 21 (para um dos genitores), das 13h30 às 17h30, e 22 (para o outro genitor e mais uma turma para os filhos), das 8h30 às 12h30. Em abril, será nos dias 18 (genitor), à tarde, e 19 (genitor e filhos), de manhã. As oficinas são mensais, e tem turma prevista até julho.
Saiba mais. O curso é gratuito e ministrado por psicólogos e assistentes sociais. Podem participar crianças acima de 6 anos. É fornecida a declaração de comparecimento para quem precisa justificar ausência no trabalho.