Um ex-executivo da Odebrecht diz em seu acordo de delação que Geraldo Alckmin (PSDB) acertou pessoalmente o repasse de R$ 2 milhões via caixa dois da Odebrecht para sua campanha ao governo de São Paulo, em 2010.
Carlos Armando Paschoal, o CAP, que era à época diretor da Odebrecht em São Paulo, disse que Alckmin entregou a ele o cartão de visitas de seu cunhado Adhemar Ribeiro, que viria a ser o responsável por receber os recursos.
É o primeiro relato de executivos da Odebrecht a envolver diretamente Alckmin no acerto da doação ilícita. O vídeo com o relato foi liberado nesta quarta-feira (12) pelo Supremo Tribunal Federal.
Até então não havia informações sobre a atuação direta do tucano, um dos principais nomes cotados para disputar a Presidência em 2018. Ele nega as acusações.
Outro executivo da Odebrecht, Benedicto Junior, disse: “Era um pedido direto do Geraldo Alckmin”. Segundo ele, a Odebrecht esperava ser favorecida em contratos do Metrô e de saneamento.
Na campanha à reeleição, BJ disse que a quantia paga foi de R$ 8,3 milhões, via caixa dois –desta vez, intermediada por Marcos Monteiro, ex-tesoureiro do partido e ex-secretário de Planejamento.
Segundo o delator, Monteiro “falava em nome do PSDB”. O repasse foi feito com o codinome de “MM”.
Um terceiro delator, Arnaldo Cumplido de Souza e Silva, afirma que Alckmin recebeu cerca de R$ 10 milhões de doação via caixa dois em 2010 e 2014.
O ACERTO
Segundo Paschoal, o acerto de caixa dois em 2010 foi feito com Aluízio de Araujo, que fazia parte do conselho de administração da Odebrecht e morreu em 2014.
Segundo o relato, Alckmin era “muito próximo” de Araujo. Paschoal diz que foi levado pelo conselheiro a uma reunião no escritório de Alckmin, na avenida 9 de Julho, entre abril e maio de 2010.
No trajeto, Araujo antecipou que o objetivo da conversa era acertar uma doação ao tucano via caixa dois, mas não falou em valores.
Já no escritório, Paschoal disse que foi orientado a esperar na antessala enquanto Araujo e Alckmin conversavam. Após cerca de 20 minutos, ele diz ter sido chamado a entrar. Os três falaram brevemente de amenidades, fizeram piadas e não tocaram nos assuntos da campanha.
“Quando eles ficaram de pé, como quem diz ‘acabou’, o dr. Alckmin pediu à secretária um cartão”, diz Paschoal. “Ele disse: ‘Esse aqui é o meu cunhado. O que a gente combinou aqui com o dr. Araujo, você pode…'”.
O acerto que Araujo fizera, de acordo com Paschoal, foi o repasse de R$ 2 milhões. O valor era tão alto que ele precisou de autorização do seu superior, Benedicto Junior. Após a decisão, o pedido foi encaminhado ao setor que cuidava do pagamento de propina e caixa dois.
Segundo o delator, o total destinado a Alckmin era o dobro do que estava sendo planejado para Aloizio Mercadante, candidato do PT ao governo de SP naquela eleição.
“Era o maior valor que eu ia ter a responsabilidade de coordenar e, aprovado então pelo Benedicto Junior, definimos que o codinome dele seria Belém”, narra Paschoal.
A partir de então, o delator disse que passou a coordenar com o cunhado de Alckmin as entregas, em muitas parcelas –algumas de R$ 100 mil e R$ 200 mil–, feitas “preponderantemente” no escritório de Ribeiro, na avenida Brigadeiro Faria Lima, até setembro ou outubro de 2010.
Paschoal afirmou que se encontrou com Adhemar Ribeiro de cinco a seis vezes pessoalmente, pois o cunhado de Alckmin não gostava de conversas por telefone.
“É uma pessoa bem, bem… Não vou dizer desconfiada, mas cuidadosa. Então, tinha que ir lá para conversar pessoalmente. Chegava, às vezes não terminava o café e já estava saindo. Era só para combinar a senha, o dia e tal.”
OUTRO LADO
A assessoria de Alckmin afirmou, em nota, que “a reportagem erra nos fatos. O delator não aponta nenhum ato ilícito do então candidato. Seu relato deixa claro que ele não presenciou conversa, pedido ou sugestão para a prática de qualquer delito”.
O tucano nega as acusações e diz que “jamais” pediu recursos irregulares nem autorizou que o fizessem em seu nome. “Sempre exigi que minhas campanhas fossem feitas dentro da lei”, afirmou.
INVESTIGAÇÃO
O ministro Edson Fachin determinou a abertura de inquérito contra oito ministros do governo Michel Temer (PMDB), 24 senadores e 39 deputados federais. Serão abertas 76 investigações pedidas pela Procuradoria-Geral da República após as delações da Odebrecht.
Entre os citados estão os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB). Dois dos principais aliados de Temer, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secreraria-Geral), também estão na lista, que abrange ainda os senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, do PMDB, e Aécio Neves (PSDB).
No total a relação tem 98 nomes e inclui três governadores e um ministro do Tribunal de Contas da União. Algumas suspeitas da Procuradoria são corrupção, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, fraude e cartel. Fachin remeteu 201 outros casos a tribunais de instâncias inferiores envolvendo citados sem foro no Supremo –entre os mencionados estão os ex-presidentes Lula, Dilma Rousseff e Fernando Henrique Cardoso.
Os inquéritos iniciam longo trâmite. Investigarão o teor das delações, que precisarão de provas adicionais para tornar-se efetivas. Ainda há as fases de denúncia e do processo, com ampla defesa, antes do julgamento.