A apresentação do projeto de utilização da área do Aeroporto Carlos Prates para a população foi palco de nova confusão entre grupos que pleiteiam a manutenção do terminal em funcionamento e movimentos que desejam que o terreno seja destinado à construção de moradias populares. Na tarde desta segunda-feira (17/7), mesmo dia em que a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) anunciou os detalhes do plano, o Executivo organizou um evento no Centro de Referência da Pessoa Idosa, na Região Noroeste da capital, para expor as propostas aos moradores.
Durante a apresentação do projeto aos moradores, secretários da prefeitura mostraram o desenho do projeto que já vem sendo ventilado pela administração nos últimos meses, mas sem uma dimensão mais concreta da proposta. Segundo o plano, o terreno do aeroporto abrigará estruturas públicas como um parque; escolas municipais para Educação Infantil e Ensino Fundamental; um museu da aviação; uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA); e cerca de 4.500 novos imóveis, parte deles destinada à população de baixa renda.
Durante a apresentação, houve momentos em que membros da prefeitura foram interrompidos por gritos e protestos dos manifestantes pela permanência do aeroporto, prontamente respondidos pelos movimentos de luta pela moradia. Parte da revolta se deu pela falta de participação dos manifestantes nos pronunciamentos, justificada pelo Executivo pela natureza do evento, que tratava-se de um anúncio e não de um debate. Estavam presentes nomes como o secretário municipal de Governo, Josué Valadão; o diretor-presidente da Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel), Claudius Vinícius Leite Pereira; e a assessora especial da Secretaria de Governo, Lídia Vasconcellos.
Embora este seja uma dos primeiros movimentos da PBH com desenho mais explicativo sobre o que se planeja instalar na área do aeroporto, ainda faltam detalhamentos sobre a origem e o tamanho do investimento necessário para as obras e também quando elas começam a sair do papel. A prefeitura aponta que essas definições ainda aguardam a transferência definitiva do terreno para o município, movimentação prevista para setembro.
Para o presidente da Associação Voa Prates, Estevan Velasquez, a cessão definitiva do terreno do aeroporto à prefeitura ainda pode ser prorrogada diante do que considera um projeto inviável do Executivo da capital mineira. À reportagem, ele defendeu a manutenção do terminal em funcionamento e disse que as atividades aéreas podem acontecer concomitantemente a utilização da área para fins sociais. No entanto, ele diz que não há estrutura necessária na região para a construção de moradias.
“Eles vão ficar prorrogando isso pode provocar mais tempo. A prefeitura só vai receber esse terreno se apresentar um projeto de viabilidade. O aeroporto, por si só, se paga e é possível fazer tudo que está sendo proposto. Inclusive, a gente já ofereceu para a prefeitura, sem usar um centavo do dinheiro público, para cuidar do parque que já existe lá, mas não é cuidado. Já temos convênio assinado com o Senai para colocar escolas na área. Oferecemos também transformar o Hospital Alberto Cavalcanti em uma unidade de emergência com acesso à pista”, afirmou.
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Velasquez ainda ressaltou que a prefeitura poderia investir em moradias populares em outras áreas e citou o Bairro Granja Werneck, Norte da capital, como local para investimento. Segundo o líder do movimento pela manutenção do aeroporto, a mudança de finalidade do terreno no Carlos Prates está sendo usada de forma eleitoreira pela prefeitura.
Se entre os partidários pela manutenção das atividades aeroportuárias há uma esperança de que o terreno não seja entregue definitivamente à PBH em setembro, quem articula esse movimento junto ao governo federal garante que o município já terá a gestão da área do aeroporto neste ano. Ao Estado de Minas, o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), vice-líder do governo na Câmara, garantiu que não há chance de recuos na municipalização do terreno.
“Eu, como vice-líder do governo do presidente Lula, tenho cuidado pessoalmente disso. Já estivemos com o próprio vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), como o ministro de Portos e Aeroportos (Márcio França) e com o ministro das Cidades (Jader Barbalho Filho). Então o que está planejado aqui é, junto com a prefeitura, fazer com que essa área tenha destinação pública de moradia e também para suprir as carências da região. Ter uma área verde, um parque, escolas de educação infantil e uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), que é uma carência em toda região.Está bem encaminhado, não existe a menor hipótese de volta atrás desse processo”, afirmou.
O petista prosseguiu tratando sobre a movimentação em Brasília para disponibilizar o terreno ao município e viabilizar o início das obras ainda neste ano. Correia afirmou que o aporte de verbas federais ao projeto deve se dar a partir do programa de habitação Minha Casa, Minha Vida.
“O que é preciso agora é iniciar o que há de imediato. Então eles vão recuperar o parque, provavelmente já iniciar as obras da UPA, da unidade de Educação Infantil, tudo ainda este ano. A moradia já é um processo mais demorado, tem que ver qual o tipo de moradia, discutir com o Ministério das Cidades. Mas está bem avançado O governo ajudaria com o Minha Casa, Minha Vida, que é um programa nacional pelo qual o presidente Lula tem um carinho muito grande e a oferta da prefeitura agradou muito o governo federal. Foi um dos pontos fundamentais, inclusive, para a área ficar à disposição do município”, disse.
A necessidade de debates sobre as intervenções no terreno é corroborada por especialistas que avaliaram o primeiro desenho da prefeitura. Para a arquiteta, assessora técnica do coletivo Atingidos Pelo Prates e pesquisadora da PUC-MG, Viviane Zerlotini, é necessário entender a pluralidade de demandas que envolvem a região.
“Acho que é importante a gente lembrar que tem várias demandas ali, que englobam a saúde, a cultura, educação e demanda para o parque também, pois é uma área que tem nascentes, que tem uma demanda muito grande pela recarga do lençol freático. Então, é uma complexidade muito grande. A gente precisa agora acompanhar, como que vai ser o desenvolvimento desse projeto para entender em detalhes, quais são, de fato, as repercussões e como que a gente pode contribuir”, ponderou.
Em entrevista à reportagem, Zerlotini destacou como preocupações a forma como o novo bairro irá interagir com as regiões limítrofes e como será pensada a permeabilidade do solo na nova área construída. “Um ponto é entender como esse novo bairro vai ser articular com o restante dos bairros que já existem ali, o Padre Eustáquio, o Caiçara, o Jardim Montanhês. Também queremos entender um pouco melhor, como a prefeitura vai lidar com a questão das nascentes e da área de impermeabilização. A gente vê o parque com uma grande área verde, o que é muito bom, mas a gente consegue, com a o que a arquitetura e urbanismo já desenvolveu até hoje, fazer conjuntos habitacionais mais permeáveis do que o que está sendo apresentado. A gente consegue articular moradia com essas áreas verdes não dividindo, isolando o parque, mas conciliando”, destacou.
Vereadores se posicionam
Diante da apresentação do projeto da prefeitura para o terreno do Aeroporto Carlos Prates, vereadores da capital contrários à nova destinação da área assinaram um manifesto pela manutenção das atividades do terminal na cidade. O documento lançado nesta segunda-feira conta com 22 parlamentares signatários. Um deles, Braulio Lara (Novo), estava junto dos movimentos pela manutenção do aeroporto nesta tarde e conversou com a reportagem, fazendo críticas ao prefeito Fuad Noman (PSD).
“A Voa Prates, que é a associação que cuida do aeroporto, já vem se movimentando politicamente para conseguir reverter essa decisão. Então existe um apoio por parte dos deputados federais, dos deputados estaduais e, agora, o manifesto que foi assinado por 22 vereadores na Câmara e demonstra essa maioria de parlamentares que apoiam o aeroporto como um importante equipamento para a cidade. É o nosso aeroporto mais antigo, 80 anos não se jogam fora como estão jogando. A prefeitura, infelizmente, está querendo passar para as pessoas que ela tem um projeto de moradia popular que já devia ter muito antes de começar a falar de Carlos Prates. Ele já devia estar caminhando dentro do Plano Diretor nas áreas que tem infraestrutura de transportes, mais favoráveis para esse tipo de empreendimento. Em um oportunismo político, a área do Carlos Prates, acabou virando uma uma bandeira de acenos políticos claros do prefeito atual e jogando fora um importante equipamento que forma milhares de profissionais da área é aeroportuária”, declarou.
O documento enviado à Presidência da República, ao Ministério de Portos e Aeroportos e à Prefeitura de Belo Horizonte conta com a assinatura dos seguintes vereadores: Braulio Lara (Novo); César Gordim (Solidariedade); Ciro Pereira (PTB); Cláudio do Mundo Novo (PSD); Cleiton Xavier (PMN); Dr. Célio Fróis (PV); Fernanda Pereira Altoé (NOVO); Fernando Luiz (PSD); Flávia Borja (PP); Helinho da Farmácia (PSD); Henrique Braga (PSDB); Irlan Melo (Patriota); Juninho Los Hermanos (Avante); Loíde Gonçalves (Podemos); Marcos Crispim (PP); Marilda Portela (Cidadania); Reinaldo Gomes Preto Sacolão (MDB); Rubão (PP); Sérgio Fernando (PL); Wanderlei Porto (Patriota); Wesley Moreira (PP); e Wilsinho da Tabu (PP).