Um estudo divulgado no mês passado pela London School of Economics mostrou que alunos de escolas da Inglaterra que baniram os smartphones melhoraram em até 14% suas notas em exames de avaliação nacional.
O aumento acontece principalmente entre estudantes com conceitos mais baixos. Na faixa etária entre 7 e 11 anos, o banimento ajudou alunos com aproveitamento abaixo de 60% nas provas. Para o resto, não mudou nada.
“Distrações atingem todo mundo, mas são piores em alunos com celulares. E ainda piores naqueles com notas mais baixas”, diz Louis-Philippe Beland, um dos autores do estudo.
O impacto da proibição, diz ele, é o equivalente a uma hora a mais de aula por semana. O estudo “Tecnologia, distração e desempenho de estudantes” foi feito com 130 mil alunos desde 2001, em 91 escolas de quatro cidades.
Na Inglaterra, não há uma legislação sobre o uso de smartphones nas escolas. Cada colégio define sua própria política. No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei, deste ano, que visa proibir a utilização de celulares em salas de aulas.
O uso somente seria autorizado pelo professor, desde que com viés pedagógico. “Alunos não podem ter contato com celular durante a explicação. É como deixá-los conversar livremente”, diz o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), autor do projeto. Em São Paulo, desde 2007 colégio públicos estaduais já têm essa proibição.
A coordenadora de educação da Unesco (braço da ONU para educação e cultura) no Brasil, Rebeca Otero, questiona a necessidade de a legislação intervir no assunto.
“Precisa criar uma lei proibindo o aluno de bater no professor? Não. O raciocínio é o mesmo para os celulares.” Segundo ela, uma legislação assim pode ser mal interpretada pelos docentes, desestimulando-os a trabalhar com ferramentas pedagógicas.
Para Luciana Allan, doutora pela USP especializada em tecnologias aplicadas à educação, é preciso ter em mente o modo como estudos assim são conduzidos. “O celular pode atrapalhar provas que medem memorização. Mas é difícil preparar o aluno para o mundo tecnológico sem um celular na mão.”
EM SALA
A Unesco lançou, em 2013, o guia “Diretrizes de Políticas para a Aprendizagem Móvel”, que afirma que aparelhos móveis podem ajudar em sala de aula. Assim pensa o professor de física Marcelo Barão, do colégio Vital Brazil, em São Paulo, que usa aplicativos com os alunos.
O Sensor Kinetics, por exemplo, permite demonstrar fenômenos como gravidade, aceleração, rotação e magnetismo. “A aula é a mesma de 20 anos atrás, mas agora o aluno se sente mais atraído.”
Na aula de artes de Maristela Turíbio, como os jovens mexem nos celulares o tempo todo, ela propôs atividades com o aparelho. “A ideia era tirar uma selfie conceitual. O engajamento foi grande”.
Na escola estadual Imperatriz Leopoldina, em São Paulo, o celular não pode ser usado, para evitar que alunos procurem as respostas da prova na internet. “Mas tem gente que traz a cola de casa do mesmo jeito”, diz Lucas Alves, 15.
O colégio Elvira Brandão utiliza, fora de sala, o Google Classroom, aplicativo que conecta alunos e professores em tempo real, com correções de atividades, solução de dúvidas etc. Durante a aula, é proibido usar o celular, que deve ficar na mochila.
Na Escola da Vila, os alunos até o 5º ano não podem levar celulares. Do 6º ano em diante, só com permissão do professor. As atividades utilizam notebooks e tablets. O smartphone é usado só para fotografar projeções de slides ou de lousas, diz a coordenadora de tecnologias educacionais, Helena Mendonça.
O professor de história Reginaldo Polesi é contra o uso de aparelhos porque acredita que os alunos se distraem mais do que com as distrações de antigamente, como fazer aviãozinho de papel e desenhar na carteira.
Gabriela Molina, 15, utiliza o smartphone como calculadora nas aulas, além de aplicativos educacionais. Como se desconcentra com facilidade, comemora o fato de os smartphones não serem liberados o tempo todo. “Não ia conseguir prestar atenção na aula.”
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POR QUE LIBERAR O USO DO CELULAR
- É preciso trabalhar com os alunos diferentes mídias, formatos e competências, como o uso eficiente de aplicativos nos celulares
- Apps como o Star Chart (usado em aulas de astronomia, que mostra estrelas da região do céu que você apontar) deixam a aula mais interessante
- Quando o professor menciona um evento histórico, é possível pesquisar sobre ele imediatamente e trazer dúvidas e novidades
- A distração sempre existiu, causada por conversas com o colega ou desenhos no caderno. O celular é só mais uma maneira de perder o foco
- Professores e coordenadores são contra o aparelho, muitas vezes, pois têm medo que o aluno surja com questões que não saberão responder
POR QUE BANIR O USO DO CELULAR
- Ter acesso fácil ao celular faz com o que aluno tenha mais chance de distração, o que pode levar a notas mais baixas
- Adolescentes ainda não têm maturidade para usar nos momentos apropriados
- Em ambientes liberados, é muito difícil para o professor monitorar a sala toda
- A distração do smartphone é muito pior do que desenhar no caderno, por exemplo, porque o aluno entra um ‘universo paralelo’
- Muitos colégios, mesmo particulares, ainda não têm a estrutura para abrigar ferramentas tecnológicas, como sinal wi-fi comum ou com controle à navegação
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15% dos 68 milhões de usuários da internet pelo celular no Brasil têm entre 10 a 17 anos, segundo a Nielsen Ibope
Folha de S. Paulo