Depois de sinalizar que vai realizar cortes nos benefícios previdenciários e uma revisão do Sistema Único de Saúde (SUS), o presidente Michel Temer foca no Bolsa Família.
A equipe econômica do governo federal finaliza um decreto para endurecer as regras de entrada e permanência no programa social. Um pente-fino nos benefícios já está em curso.
Apenas entre julho e agosto deste ano foram desligadas 5.533 famílias do programa em Minas, uma economia de R$ 640 mil. Em todo o Brasil, os cortes batem a casa dos R$ 3,6 milhões, com eliminação de 57 mil beneficiários.
Criado no governo Lula, o programa beneficia 13 milhões de famílias no Brasil e pouco mais de 1 milhão no Estado. Para 2016, a União prevê gastar R$ 28,8 bilhões com o benefício. O montante é quase metade do necessário para pagar o reajuste do Judiciário, de R$ 58 bilhões.
Estratégias
Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social e Agrário, o decreto está sendo formulado em conjunto com os ministérios da Fazenda e do Planejamento.
“A intenção é melhorar a governança do programa e melhorar a focalização, garantindo o acesso e a permanência de quem mais precisa do Estado e pelo tempo que for necessário”, destaca, em nota.
Para isso, haverá uma ampliação do cruzamento de informações dos beneficiários com outras bases de dados, como o Sistema Informatizado de Controle de Óbitos (Sisob), Relação Anual de Informações Sociais (Rais), Folha de Benefícios do INSS, Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape), FGTS, guias da Previdência Social e outras.
Antes, o confrontamento de dados era feito apenas uma vez por ano e não contava com todas essas bases. “Com este cruzamento mensal, teremos a possibilidade de efetivamente promover uma boa gestão do programa e dos recursos públicos envolvidos”, diz o ministério.
Essa é uma estratégia para barrar irregularidades, conforme o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima. “O Bolsa Família é extremamente importante para o Brasil e será mantido. Mas não serão mantidos erros e fraudes praticados e usados para atrair votos em grande parte do Brasil”, pondera Lima.
Apoio
Para o deputado federal Newton Cardoso Júnior (PMDB), a mudança é necessária. “O programa só tem porta de entrada. Porém não pode ser mantida essa dependência eterna”, afirma.
Para o parlamentar, outra possível mudança é a exigência de CPF até para as crianças beneficiadas, sob pena de corte do benefício.
Além disso, o benefício poderá ser cancelado automaticamente na segunda vez que a família for notificada por inconsistências cadastrais. Atualmente, isso ocorre na terceira ocorrência.
“Vamos fazer essa revisão para atender quem realmente precisa porque tem até pessoas falecidas recebendo. E os cortes são muito necessários”, pondera.
De acordo com o deputado federal Lincoln Portela (PR), o governo estima que há cerca de 500 mil famílias irregulares.
Levando em conta que a média paga aos beneficiários é de R$ 182,62, o governo alcançaria economia aproximada de R$ 91,3 milhões.
Corte no benefício pode agravar crise social e econômica
A burocratização no cadastro no Bolsa Família pode agravar o quadro de desigualdade e pobreza no país e impactar negativamente a economia brasileira, afirmam especialistas.
Um dos pontos criticados pela professora de Gestão e Políticas Públicas da USP Cristiane Kerches é a exigência do CPF dos filhos para que os pais tenham acesso ao programa. “Geralmente são famílias excluídas socialmente, com baixo nível de informação. Elas terão dificuldade no processo e serão eliminadas”, destaca.
A especialista avalia o endurecimento das regras como uma escolha política e não econômica, já que o programa custa pouco para a União. “O governo preferiu tirar direito dos mais pobres, ao invés de tributar as grandes fortunas”, observa.
Recurso
Professor da Escola do Legislativo, Fabrício Augusto de Oliveira destaca que o Bolsa Família é responsável por girar a economia em vários locais, principalmente em regiões mais pobres e isoladas. “O recurso gera uma demanda por bens onde não existia. Fomenta a economia de pequenos mercados e gera empregos”, comenta.
O deputado federal Patrus Ananias (PT-MG), agora oposição, enfatiza que os reflexos positivos do programa, como o Brasil ter sido retirado do Mapa da Fome. “O governo está desmanchando uma rede de proteção social, que vai impactar em setores como educação e saúde”, critica.