O presidente Jair Bolsonaro (PSL) voltou a chamar o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos principais símbolos da repressão durante a ditadura militar, de “herói nacional”.
O presidente receberá no Palácio do Planalto, nesta quinta-feira (8), a viúva do militar, Maria Joseíta Silva Brilhante Ustra, a quem se referiu como alguém com “coração enorme”.
Ustra foi condenado em segunda instância por tortura e sequestro no regime militar (1964-1985).
Ao ser questionado sobre o motivo da agenda com Maria Joseíta, Bolsonaro disse que ela foi a revisora do livro de Ustra e que está cheia de histórias para contar sobre as mulheres presas durante a ditadura militar (1964-1985).
“Tudo o que ela fez no tocante ao bom tratamento a elas [mulheres presas na ditadura], no tocante a enxoval, dignidade, parto. E ela conta uma história bem diferente daquela que a esquerda contou para vocês. Tem um coração enorme. Eu sou apaixonado por ela. Não tive muito contato, mas tive alguns contatos com o marido dela enquanto estava vivo. Um herói nacional que evitou que o Brasil caísse naquilo que a esquerda hoje em dia quer.”
Em entrevistas antes de ser eleito presidente, Bolsonaro já apontava a obra “Verdade Sufocada”, escrita por Ustra, como seu livro de cabeceira. “É uma mulher que tem histórias maravilhosas para contar das presidiárias de São Paulo, envolvidas com a guerrilha”, disse.
Em 2008, Ustra tornou-se o primeiro oficial condenado na Justiça brasileira em uma ação declaratória por seqüestro e tortura durante o regime militar.
A sentença, do juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São Paulo, de primeira instância, foi uma resposta ao pedido de cinco pessoas da família Teles que acusaram Ustra, um dos mais destacados agentes dos órgãos de segurança dos anos 70, de seqüestro e tortura em 1972 e 1973.
Em sua defesa, Ustra disse que a ação contraria a Lei da Anistia (1979), que significou o perdão dos crimes cometidos durante a ditadura. A decisão da primeira instância depois foi confirmada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em 2012.
Outras declarações
Esta não é a primeira vez que Bolsonaro chama o coronel condenado de atos de tortura de herói.
No dia da votação na Câmara que autorizou a abertura do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016, ele dedicou seu voto ao coronel.
“Nesse dia de glória para o povo tem um homem que entrará para a história. Parabéns presidente Eduardo Cunha. (…) Em memória do coronel Brilhante Ustra, o meu voto é sim”, disse, elogiando também o ex-presidente da Câmara, hoje preso, responsável pela abertura do processo contra a petista.
Também em 2016, durante uma sessão do Conselho de Ética que analisava uma representação contra ele, então deputado federal, voltou afirmou que Ustra é um “herói brasileiro”, além de ter dito que não há provas de que ele torturou presos políticos.
“Sou capitão do Exército, conhecia e era amigo do coronel, sou amigo da viúva. (…) o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra recebeu a mais alta comenda do Exército, a Medalha do Pacificador, é um herói brasileiro”, afirmou o deputado.
Ustra comandou o DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações) do 2º Exército (SP) de 1970 a 1974, no auge do combate às organizações da esquerda armada.
Segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, só na gestão de Ustra o DOI de São Paulo foi o responsável pela morte ou desaparecimento de ao menos 45 presos políticos.
Capitão reformado do Exército, Bolsonaro tem falado com frequência sobre o regime militar nas últimas semanas. Em suas declarações, tem usado dados falsos, ironizado vítimas e contestado documentos oficiais do Estado brasileiro sobre mortes e desaparecimentos durante a ditadura militar.
Na semana passada, ele ironizou o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, dizendo que poderia contar o destino de seu pai, Fernando Santa Cruz, desaparecido em 1974, após ter sido preso pelo governo.
Na manhã desta quinta, ele publicou um vídeo em suas redes sociais no qual compara a Comissão da Verdade, responsável por investigar os casos de mortes e desaparecimentos durante a ditadura, a um livro escrito por prostitutas.
“Comparo a Comissão da Verdade, esta que está aí, como aquela cafetina que queria escolher a sua biografia e escolheu sete prostitutas. O relatório final das prostituas era de que a a cafetina deveria ser ser canonizada. Esta é a comissão da verdade de Dilma Rousseff”, afirmou na ocasião.
O discurso é de novembro de 2014, quando Bolsonaro era deputado federal. Ainda na publicação nas redes sociais, ele disse que o tema será abordado em transmissão ao vivo que ele fará na noite desta quinta.