O PT de Minas Gerais pagou cerca de R$ 675 mil na campanha eleitoral do ano passado –na qual Fernando Pimentel foi eleito governador– a uma empresa que não existe no local registrado. Pela prestação de contas, a firma realizou serviços de transporte de cargas e de locação de veículos ao partido.
Daniel Gonçalves Coutinho, 22, abriu a “Transportadora Coutinho” menos de oito meses antes das eleições e declarou à Junta Comercial ter um capital de R$ 30 mil, preço de um carro popular. Como microempresa, a transportadora pode ter uma receita anual máxima de R$ 360 mil.
Como endereço da firma, registrou a casa onde mora seu pai, que fica em local de difícil acesso na cidade de Santa Luzia, região metropolitana da capital. Em vez de seu próprio telefone e e-mail, informou dados da companhia de contabilidade que registrou a transportadora.
A Folha esteve no endereço em que a transportadora é registrada, mas a madrasta de Daniel Coutinho disse que nunca funcionou empresa alguma no local –uma casa simples, sem qualquer placa.
Procurado, Daniel respondeu, na noite desta quarta (17), que a empresa fica mesmo no local registrado e que sublocou vans e ônibus para a campanha do PT.
Quando abriu a empresa, ele morava em uma residência coletiva em Belo Horizonte e se mudou para outro bairro após a campanha. A transportadora, diz a documentação, é a sua primeira atividade empresarial.
Entre 9 de setembro e 4 de outubro de 2014, houve cinco pagamentos do comitê financeiro do partido –responsável, entre outros candidatos, pela campanha de Pimentel– e mais dois repasses da direção estadual da legenda.
A prestação indica que o primeiro serviço eleitoral foi a segunda nota fiscal emitida pela empresa –que já existia havia sete meses.
Além do PT, o candidato derrotado a senador Josué Alencar (PMDB) pagou R$ 6.700 à transportadora. O serviço, segundo documentação apresentada, foi de execução de jingles por uma van e um carro nas ruas da capital.
Inicialmente, Coutinho disse à Junta que prestava serviços apenas de “transporte rodoviário de carga”, mas depois de já ter recebido mais de R$ 300 mil para “locação de bens móveis” à campanha, informou que também faria “transporte escolar, rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento intermunicipal, estadual e internacional” e “locação de automóveis sem condutor e serviços de transporte de passageiro com motorista”.
O capital da firma seguiu com o valor de R$ 30 mil.
Em dezembro, as contas eleitorais de Pimentel foram rejeitadas pelo Tribunal Regional Eleitoral mineiro, por exceder o limite de gastos. A coligação recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral.
OUTRO LADO
Por telefone, Daniel Coutinho confirmou que trabalhou para a campanha de Pimentel, disse que não podia explicar o serviço que fez e pediu para a reportagem ligar mais tarde. Procurado novamente, ele não atendeu às ligações e bloqueou o número do repórter em um aplicativo de mensagens por celular.
Um dia depois, Daniel afirmou à reportagem que sua empresa subloca ônibus, caminhões e vans de terceiros quando necessário, e que esse foi o caso da campanha.
Segundo seu advogado, Ricardo Teixeira, embora a madrasta de Daniel tenha dito que a empresa não funciona na casa do seu pai, ela existe, sim, no local. Também disse que é possível mudar a categoria da transportadora, registrada como microempresa, no ano seguinte.
Procurado e informado do teor da reportagem, o PT de Minas respondeu que “a contabilidade eleitoral já foi encerrada e tudo está devidamente declarado e disponível no site”. “Todas as nossas despesas e receitas obedeceram a legislação eleitoral vigente”, informou o partido.