Os moradores de Catas Altas da Noruega, na Região Central de Minas, estão em festa para homenagear Nossa Senhora das Graças e recordar um surpreendente episódio ocorrido há mais de sete décadas. Em 29 de julho de 1949, a imagem da padroeira foi encontrada na zona rural após cair, sobre uma árvore, de um avião de carga que fazia a rota Rio de Janeiro (RJ) – Belém (PA) e sofreu pane em um motor. O ponto alto do jubileu será a missa no próximo sábado, às 17h.
“Esperamos muitos romeiros para a celebração iniciada no dia 20. É um momento importante na história da cidade, onde a devoção é muito forte”, diz o reitor do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora das Graças e titular da Paróquia São Gonçalo do Amarante, padre João Luiz da Silva. Com o fato inusitado, a cidade ficou com dois padroeiros, mas o padre explica: “São Gonçalo é o protetor da paróquia, e Nossa Senhora das Graças de todo o município, com a imagem no altar do santuário”.
Este ano, além de recordar os 74 anos da queda da imagem milagrosa do avião, a comunidade de fé celebra o 3º Ano Vocacional, com o tema "Vocação: graça e missão". A programação inclui novena, recitação do terço e missas, além de atividades culturais e as tradicionais barraquinhas.
“Trata-se de uma época muito festiva para nossa cidade, especialmente pela história da ‘santa que caiu do céu’, há 74 anos. Assim, o dia 29 de julho ficou como uma das principais datas do município”, diz o historiador Giovane Neiva, integrante do Conselho Municipal do Patrimônio de Catas Altas da Noruega. Ele informa que a gruta existente perto do local da queda da imagem foi toda revitalizada e que o trevo na entrada da cidade ganhou um monumento com uma réplica da aeronave, fotos dos casarões dos tempos coloniais e uma imagem da padroeira.
HISTÓRIA E FÉ
Na edição de 10 de julho de 1954, cinco anos após a queda da imagem, a antiga revista O Cruzeiro, dos Diários Associados, entrevistou personagens principais do caso. A história, com fotos, está documentada no Museu e Arquivo Histórico da cidade. A maior parte do material levado no avião seguia para a unidade da Marinha.
Em 2 de agosto de 2009, o Estado de Minas publicou ampla reportagem sobre a história. Conforme a matéria, os católicos celebravam três milagres: a peça sacra ficou inteira; chegou na véspera das homenagens à santa, que teve uma imagem encomendada na capital, mas foi esquecida pelo portador, e o avião não se acidentou.
Na reportagem do EM, a funcionária pública aposentada Maria da Conceição Rezende contou que tinha 8 anos quando viu, por volta das 16h, o avião Curtiss Comander C-46, da antiga Companhia Itaú de Transportes Aéreos, voando baixo e soltando fumaça, antes de despejar a carga na zona rural. A carga continha geladeiras, cerca de 500 pares de sapatos, fardos de linho, tapetes, máquinas de escrever e as imagens de São Francisco, do Sagrado Coração de Jesus e de Nossa Senhora das Graças, a única que não se quebrou. Diante da pane e do perigo, os tripulantes resolveram se livrar da carga, a fim de tornar o avião mais leve e apto a planar. E a aeronave chegou sem problemas ao aeroporto da Pampulha, em BH, primeira escala da rota.
Um fato curioso tornou a história ainda mais especial. Naqueles tempos, quando Catas Altas da Noruega era distrito de Conselheiro Lafaiete, estava à frente da paróquia o padre Luiz Gonzaga Pinheiro (1920-1995). Devoto de Nossa Senhora das Graças, ele encomendou uma imagem da santa a uma loja de Belo Horizonte, para levá-la ao altar em 30 de julho, dia dedicado a São Gonçalo do Amarante. Só que o encarregado de buscar a peça em BH se esqueceu de trazê-la – “a viagem até a capital era longa, com trechos a cavalo, de jardineira e trem”, relatou dona Naná.
O desfecho é ainda mais inusitado. Ao ser comunicado pela companhia aérea sobre as cargas, o delegado de polícia tratou logo de devolver tudo o que encontrou aos donos da Itaú. De comum acordo, e atendendo um pedido do padre Luiz, quem considerava a imagem (de gesso, com 50 centímetros de altura) fruto de um milagre, achou melhor deixá-la na igreja.
A missa no dia 29 será celebrada pelo bispo de São João del-Rei, dom José Eudes Campos do Nascimento.