Na Terra Indígena (TI) Yanomami, de 9,6 milhões de hectares, a forma como o garimpo impacta as comunidades é denunciada há décadas, tanto por lideranças quanto por veículos do jornalismo independente e local. Os yanomami são um povo que constantemente rememora um dos eventos mais marcantes e extremos de violação de direitos, conhecido como Massacre de Haximu. Esse foi o primeiro caso reconhecido pela Justiça brasileira como um crime de genocídio.
A chacina ocorreu em agosto de 1993. O conflito começou quando garimpeiros ilegais do Alto Orinoco descumpriram um acordo feito com os yanomami que viviam em uma região montanhosa de fronteira entre o Brasil e a Venezuela. No dia 15 de junho, sete garimpeiros convidaram seis indígenas para caçar e executaram quatro deles durante o percurso.
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Em retaliação, os yanomami assassinaram um dos garimpeiros. Pouco mais de um mês se passou e, no dia 23 de julho, um grupo de garimpeiros invadiu a aldeia, onde estavam alguns yanomami – a maioria, mulheres e crianças –, e mataram a tiros e golpes de facão 12 yanomami. As vítimas foram um homem, uma mulher, três adolescentes, duas idosas, quatro crianças e um bebê.
Em 2022, completaram-se 30 anos da homologação da TI, em meio a problemas ainda sem solução definitiva. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no mês de junho, a comunidade de Xihopi fazia uma celebração para marcar a data, mas também aproveitava a ocasião para compartilhar relatos de episódios de violência causados, ainda hoje, por garimpeiros. Ao todo, estima-se que haja, atualmente, cerca de 20 mil garimpeiros na TI.
Oito meses antes, em 13 de outubro de 2021, lideranças da comunidade Macuxi Yano, região do Rio Parima comunicavam à Hutukara Associação Yanomami (HAY) o desaparecimento de duas crianças, de 5 e 7 anos de idade, enquanto brincavam na água, próximo a uma balsa de garimpo. Uma equipe do Corpo de Bombeiros iniciou as buscas imediatamente e, no mesmo dia, encontrou o corpo do menino mais novo. No dia seguinte, a corporação localizou a segunda criança, também sem vida.
Em abril de 2022, outra tragédia arrasava o povo yanomami. O luto agora se instalava pela perda de uma menina de 12 anos, estuprada e morta por garimpeiros, na comunidade de Aracaçá, que fica na região Waiakás, estado de Roraima. A região é uma das mais impactadas pelo garimpo.
Malária e insegurança alimentar
No local, concorrem com a fome, a malária e a contaminação pelo mercúrio. Como resposta, o Ministério da Saúde declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) e instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE – Yanomami).
As ameaças à segurança alimentar, especificamente, já estiveram, inclusive, em outubro de 2019, no radar do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que alertou para a fome de crianças yanomami. Na época, calculava-se que, entre a parcela aldeada, oito em cada dez crianças menores de 5 anos padeciam de desnutrição crônica, condição que pode comprometer, de modo irreversível, o desenvolvimento mental, motor e cognitivo ou mesmo levar a óbito.
Desde que vieram à tona imagens de yanomami desnutridos, debates também foram suscitados, abordando, inclusive, a necessidade de se seguir certo protocolo de divulgação, para se respeitar a memória das vítimas da crise socioambiental que esfacela o território.