A situação de penúria por que passa a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) começa na falta de recursos para pesquisas científicas e chega aos banheiros: faltam papel higiênico e sabão para lavar as mãos. “Começou a piorar em 2016. Diminuiu muito o recurso, é como cobertor curto: cobre de um lado para descobrir o outro”, revelou a professora doutora do Departamento de Matemática e do Programa de Pós-Graduação em Educação Jussara de Loiola Araújo.
No caso dos banheiros, a falta de itens básicos de higiene levou uma aluna a criar um perfil numa rede social para orientar os colegas sobre onde encontrar banheiro em condição de uso.
A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2017 destinou R$ 1,94 bilhão para a UFMG. Neste ano, o valor passou pelo ajuste de 2,95% – previsto pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O montante destinado ao ensino superior caiu de R$ 1,07 bilhão para R$ 1,04 bilhão. A situação é pior quando se leva em consideração a rubrica denominada “investimento” na LOA. O valor anual previsto passou de R$ 49,67 milhões em 2017 para R$ 21,83 milhões neste ano – queda de 56%.
Jussara considera que o corte de recursos limita bastante o trabalho de pesquisa de docentes e alunos. Os editais para obter bolsas tanto pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) quanto pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) estão levando mais tempo para serem publicados, e há atraso no repasse dos recursos.
Outra questão levantada por docentes é a falta de verba para que professores de outros Estados e países venham a Minas participar de bancas de mestrado e doutorado. “Limita a troca de conhecimento”, ressalta Jussara. A crise pode, inclusive, estar motivando a saída de professores estrangeiros concursados da UFMG. “Pelo menos duas professoras estrangeiras voltaram para seus países: Suíça e Espanha”, revela.
Rogéria Serakides, professora doutora da Escola de Veterinária da UFMG, especialista em patologia e com vários prêmios no exterior, fez um desabafo recentemente nas redes sociais denunciando a situação de penúria da UFMG. Ela postou uma foto de seu gabinete dizendo que tudo que aparece – exceto o microscópio – foi comprado com o salário dela. “Além disso, o papel e as canetas que uso, a tinta da impressora, o cafezinho que bebo, o avental que uso, a bota que calço na necropsia, tudo também é comprado com meu salário! Pergunte aos meus colegas, e eles dirão o mesmo! Basta!”, reagiu a professora no Facebook.
Serviço de limpeza já está reduzido
Desde o dia 1° de junho, o número de funcionários terceirizados que cuidam da limpeza dos banheiros da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi reduzido para conter gastos: caiu de 400 para 160 funcionários, conforme matéria publicada no site da universidade. A decisão foi tomada porque um acordo com o sindicato da categoria determina o pagamento de adicional de insalubridade de 40% para os funcionários que higienizam banheiros com grande circulação de pessoas.
“Esse pagamento, feito aos mais de 400 trabalhadores, elevou os valores do contrato em cerca de R$ 300 mil mensais”, informa a reportagem do site. Com a redução do quadro de funcionários, o acréscimo passou a ser de R$ 200 mil.
A crise na UFMG se arrasta desde 2015. Em março daquele ano, a instituição suspendeu temporariamente o pagamento das contas de água e de luz, além de cortes em serviços terceirizados para se adequar a um decreto do governo federal que determina o contingenciamento de 33% dos recursos destinados às instituições federais de educação.
Rede social evidenciou problema
Na hora do aperto e sem papel higiênico, muitos alunos da UFMG tinham que se virar diante da falta de materiais nos banheiros da instituição. A situação chegou a tal ponto que uma aluna do 2º período de letras decidiu criar um perfil no Twitter para orientar estudantes de todos os departamentos sobre qual banheiro possui sabão e papel.
Daniela Zschaber, 20, batizou o perfil de “Onde tem papel e sabão na UFMG”. “Tive a ideia de criar uma página em que a galera vai se ajudando e contando onde tem sabão, onde tem papel. E o assunto repercutiu. Acabei denunciando um problema sem querer”, conta Daniela.
Em dois dias, a página somava 366 seguidores e repercutiu em outros Estados. “Os alunos da Universidade Federal de Goiás (UFG) também criaram uma página inspirados na gente. Disseram que lá também está assim. O problema não é só da nossa universidade. O desespero é geral”, comentou.
Na tarde dessa sexta-feira (15), muitos alunos correram para o banheiro do quarto andar da letras. “Quarto andar da letras tem papel, só falta o sabão”, postou um estudante. A UFMG foi procurada e não havia se manifestado até o momento.