A situação das penitenciárias de Minas Gerais, especialmente quando se trata das alas femininas, é precária e revela situações de abuso e agressões contra as presidiárias, que vivem em situação insalubre, de acordo com relatório emitido em junho de 2023 pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Minas Gerais (CONEDH). O documento revela um déficit nos atendimentos médico, psicológico, odontológico e social em presídios do Estado.
O relatório da CONEDH trata especialmente das unidades Presídio Feminino de Vespasiano, Presídio Antônio Dutra Ladeira e Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, e do Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto, em Belo Horizonte. A comissão, que avaliou a situação nas prisões, realizou visitas técnicas no período de maio a julho de 2022.
Dos quatro complexos visitados, três estão superlotados e apenas um deles tem uma cela exclusiva para pessoas LGBTQIA+. Os presídios de Ribeirão das Neves são os mais cheios: a unidade José Martinho Drumond abriga mais do que o dobro da sua capacidade, apresentando uma taxa de ocupação de 241%, enquanto o Presídio Antônio Dutra Ladeira mantém a taxa em 198%.
Principais queixas das presidiárias ao CONEDH
As reclamações abordam aspectos da estrutura, atendimento jurídico, assistência social e de saúde, além de queixas de abusos e agressões dos agentes penitenciários contra as pessoas presas e seus familiares e amigos, quando comparecem às prisões para as visitas.
Nos presídios houve reclamações da ausência de vasos sanitários, colchões molhados, carência de chuveiros, banhos frios e esgotos entupidos. As refeições estariam sendo servidas cruas, azedas e com caramujos e minhocas. As detentas ainda estariam sendo privadas do banho de sol e suas famílias sendo desrespeitadas nas ocasiões das visitas.
O atendimento é precário em todos os âmbitos: jurídico, médico, psicológico e social, faltando até mesmo medicamentos de controle. Muitas das mulheres não sabem a situação de suas movimentações processuais, como procedimentos de revisão de pena e concessão de benefícios de auxílio reclusão.
Além da estrutura dos banheiros, que não atendem às necessidades das mulheres privadas de liberdade, elas ainda sofrem com a entrega inconstante de kits de higiene, deixando as detentas dependentes do envio de pessoas de fora do presídio, como familiares, amigos e entidades que levam doações para as prisões.
Plataforma “Desencarcera!”
A plataforma Desencarcera! recolhe reclamações anônimas sobre presídios e reúne dados a respeito da situação das cadeias, como superlotação e número de denúncias. Em um ranking com o número de reclamações, o Presídio Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves, ocupa o segundo lugar.
Dona Tereza, candidata a deputada estadual, coordenadora e mobilizadora social do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, explica que o principal motivo das reclamações se deve à falta de investimento do Governo de Minas Gerais que, de acordo com ela, “não move uma palha”.
A ativista diz que “falta investimento na qualificação de pessoas que trabalham no cárcere” e, na visão dela, investe-se mais em armamento do que na reforma social das pessoas privadas de liberdade. “Tem bala e spray de pimenta, mas não tem kit de higiene”, conta ao relatar que o sabão, o papel higiênico e os absorventes faltam quase sempre.
Assim como pensa Dona Tereza, o responsável por assuntos penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil, Maikon Vilaça, ressalta que precisa-se de “uma equipe técnica especializada, especialmente para mulheres”. Além da falta de qualificação, algumas unidades para mulheres funcionam com guardas do sexo masculino, apesar de ser recomendado que sejam agentes femininas para tratar das mulheres.
O que diz a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais
Por meio de uma nota, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) justificou a situação precária dos presídios mediante a pandemia de Covid-19 e os efeitos causados pela doença no Estado. Consta na nota que “o Departamento Penitenciário de Minas Gerais estava iniciando os ajustes e protocolos para combater a disseminação da Covid-19 no interior das unidades prisionais”.
Além disso, a Secretaria afirma que o relatório é antigo e não traz “informações detalhadas que permitam a abertura de procedimentos investigativos”. A nota termina dizendo que “todas as denúncias que chegam por meio dos canais oficiais, criados para este fim, e que contenham informações que possibilitem a abertura de procedimentos internos, são apuradas com o rigor que os casos requerem”.
O que diz a Defensoria Pública
A Defensoria Pública de Minas Gerais, também por meio de nota, relata que “grande parte das violações de direitos humanos relatadas já eram de conhecimento” do órgão. Os principais problemas já estariam sendo resolvidos, “priorizando a solução extrajudicial, quando possível”, como consta no comunicado encaminhado ao Estado de Minas.
Seguindo as recomendações dadas pelo Conselho Estadual de Defesa de Direitos Humanos, a Defensoria Pública declara que “a Instituição realiza frequentemente mutirões de atendimento jurídico nas unidades prisionais do Estado, ocasião em que todas as pessoas são atendidas e informadas acerca da situação jurídica em que se encontram”, e foram realizados recentemente mutirões em três dos presídios apontados.