O mês de julho chegou à capital mineira batendo recordes de frio e, apesar de agradar os amantes do inverno, acende um alerta para a parcela da população que fica mais vulnerável ainda nesta época: as pessoas em situação de rua. Enquanto as temperaturas caem, a demanda por abrigo, roupas quentes, alimentos e itens de higiene pessoal aumenta consideravelmente. No entanto, muitos projetos sociais têm enfrentado dificuldades para atender a essas necessidades, já que as doações não acompanham a alta demanda.
O cenário ainda surge com um agravante: o número de pessoas sem teto aumentou. Se levado em conta o Censo Pop 2022 realizado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), o número de pessoas em situação de rua chegou a 5.344, o que representa um aumento de 192% nos últimos oito anos. O cenário é ainda pior se observados os dados considerados pelo Polos de Cidadania da UFMG, que calcula de 11,3 mil pessoas nas ruas de BH.
De acordo com Samuel Rodrigues, membro da coordenação do Movimento Nacional da População de Rua, o cuidado com essas pessoas no frio deve ser redobrado. “Não resta dúvida que a vulnerabilidade das pessoas aumenta na época de inverno; idosos, pessoas com doenças crônicas, pneumonia, mais sensíveis a gripes… Essas pessoas têm sua saúde mais comprometida e necessitam de um cuidado maior nesse período”, afirma.
Os voluntários que atuam na capital relatam queda nas doações de alimentos e das doações em espécie. Alguns dos principais motivos apontados são a queda do poder aquisitivo e a necessidade de conscientização da população sobre a população em situação de rua.
Fraternidade Espírita Lar de Luz (Felluz)
A Fraternidade Espírita Lar de Luz (Felluz) foi criada em 2004 e atende, além da população sem teto, a população carente em torno de Belo Horizonte, como Santa Luzia, Ribeirão das Neves, e alguns aglomerados, como o Cercadinho. De acordo com Alexandre Lima, um dos fundadores da Felluz, a demanda tem aumentado nos últimos anos, mas a ajuda tem diminuído.
“Vimos na pandemia um crescimento enorme no número de pessoas em situação de rua, que vieram de diversos setores, inclusive, famílias inteiras. E no frio, ainda mais rigoroso como tem sido, a necessidade na rua é urgente. As doações vêm diminuindo substancialmente nos últimos anos. Principalmente com relação aos itens da cesta básica. E este ano, notamos uma queda ainda maior. Tem sido muito difícil assistir as comunidades bem como os projetos que visam levar alimentos à população de rua”, destaca.
Para ele, o aumento dos preços não é o único fator agravante, a falta de conscientização da população também ocasiona uma menor mobilização para doações, além da elaboração de políticas públicas mais efetivas.
“Aponto como as principais causas: a queda do poder de compra devido à política dos últimos quatro anos e falta de informação e conscientização sobre a população de rua. É necessário conscientizar quem são as pessoas em situação de rua, retirando delas o estigma social que as invisibiliza e políticas públicas que visem atingir principalmente os vulneráveis”, pontua Alexandre.
Lima ainda destaca como a população pode contribuir: “Primeiramente com empatia e um novo olhar. Com conscientização. Não são mendigos e, sim, pessoas em situação de rua. Situação esta que muitos de nós estamos sujeitos. Também, é claro, com doações, sejam elas em roupas, agasalhos, cobertores, alimentos e até mesmo de valores em dinheiro.”
Saiba como ajudar:
Recebimento de doações: Pastoral de Rua — Rua Além Paraíba, nº 208, Bairro Bonfim; Rua Itajubá, nº 173, Bairro Floresta.
Pix: CNPJ: 07.747.821/0001-35
Informações da Fellluz: (31) 98643-1056
Comida que abraça
O Projeto Comida que Abraça completou três anos em abril deste ano. Essa Organização da Sociedade Civil (OSC) começou na pandemia, com o objetivo de minimizar a fome da população em situação de rua. De acordo com Renata Camargo, idealizadora do projeto, chegou a um ponto que era necessário continuar. “No fim de 2020 percebemos que não era mais possível parar e oficializamos o projeto. Hoje possuímos uma escola de gastronomia e ações voltadas para pessoas em situação de rua e egressos do sistema prisional.”
O Comida que Abraça recebe alimentos e doações em espécie e, em épocas de frio recebe agasalhos, cobertores e roupas de inverno. No entanto, Renata afirma que as doações têm sido escassas. “Está apertado para todo mundo, é uma queixa comum a todos. É difícil encontrar grana para doação”, afirma.
O cenário piora no inverno com o aumento do número de pessoas atendidas pela ação. “Atendemos no inverno pessoas que não atendemos em outras épocas. Além do fato de que a população em situação de rua em geral aumentou muito nos últimos anos. Ao longo do ano, saímos uma vez na semana, no frio saímos de três a quatro vezes”, declara Renata.
“Compartilhar é a única saída. Precisamos andar no coletivo”, finaliza.
Saiba como ajudar:
PIX no CNPJ: 43.043.804/0001-80
Contato para doações e mais informações: (31) 99749-6104
Sopão Solidário
O projeto Sopão Solidário começou há sete anos, quando um grupo de amigos se juntou com o mesmo ideal: ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade. Desde então, o projeto realiza ação fixa de distribuição de refeições toda quarta-feira, além de assistência às famílias.
O projeto, de acordo com Débora Morais, uma das voluntárias, “recebe de tudo”. “A gente sempre fala que é impressionante como dá pra conseguir destino para tudo”, brinca.
Débora ainda fala sobre o cenário nas doações dos últimos meses: “Continua com uma dificuldade nas doações. Cesta básica quase não recebemos, sendo que antes recebia bastante. É custoso, às vezes tem que acabar comprando, mas as doações de dinheiro também não são muitas mais. Acabamos tendo que ser muito criativos na cozinha."
“A carência existe mesmo longe do frio, mas a procura no inverno aumenta bastante. Todo mundo já passou fome, nem que seja por algumas horas. Se nesse pouco tempo é ruim, imagina aqueles que passam dias sem comer. Precisamos ajudar sem julgar o outro”, finaliza Débora.
Saiba como ajudar:
PIX: 00060857684
Informações e doações no número: (33) 99990-7371
Vida Nas Ruas
O Projeto Vida Nas Ruas completou três anos neste ano e é responsável por distribuir uma vez no mês kits de alimentos não perecíveis para pessoas em situação de vulnerabilidade. Elizete é uma das voluntárias do projeto que também constata a queda nas doações, principalmente por questões financeiras da população em geral. “Têm diminuído bastante as doações. Muita gente diminui o valor, a frequência ou para completamente, e também diminui o número de voluntários. Eu diria que tem a ver com a questão financeira, tudo ficou mais caro, então fica difícil.”, conta
“Atendemos muita gente, mas ainda chegamos em casa com a sensação tipo ‘poderia ter feito mais’”, afirma Elizete. Ela ainda pontua que, a falta de conscientização, é também um dos motivos que impacta na frequência das doações. “Essa população é muito mal vista, e precisamos nos colocar no lugar do outro. São pessoas como nós e que, mais do que nunca, precisam de ajuda”, completa.
Saiba como ajudar:
PIX: Telefone: (31) 98885.1210
Os interessados em doar ou serem voluntários podem também entrar em contato no telefone acima ou através do Instagram do Vida nas Ruas.
* Estagiária sob supervisão do subeditor Thiago Prata