Nos últimos anos, Minas Gerais vem liderando no país a geração distribuída (GD) de energia elétrica produzida por pequenas usinas. No entanto, o negócio, antes promissor, está ameaçado por um impasse entre a Cemig e as empresas que instalam as mini e pequenas usinas de energia solar fotovoltaica, com o risco de frear investimentos e de acabar com centenas de empregos no estado, especialmente no Norte de Minas e no Vale do Jequitinhonha, as áreas mineiras mais carentes, que sofrem com a seca..
“A situação é extremamente preocupante”, afirma o diretor regional da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABCD) em Minas Gerais, Walter Abreu. Segundo ele, a Cemig não está atendendo aos novos pedidos de interligação feitos pelas empresas que vendem os equipamentos para geração de energia pelos consumidores na maioria dos municípios mineiros, especialmente, no Norte de Minas, Jequitinhonha e Triângulo, sob alegação de falta de capacidade técnica – de que não há mais espaço disponível – para a conexão de novas usinas em sua rede elétrica.
Abreu afirma que a negativa da concessionária está causando enorme prejuízos no segmento de geração distribuída no Norte e no Jequitinhonha, onde o imbróglio coloca em risco de fechamento cerca de 400 empresas do setor, podendo ter como consequência o fim de cerca de 4 mil empregos nas duas regiões situadas na Área Mineira da Sudene. Historicamente, ambas sofreram com a falta de chuvas. Com o surgimento da geração da energia solar fotovoltaica, o Sol forte, antes visto como problema, virou solução para a criação de emprego e renda.
Para o Norte de Minas, foram atraídas grandes usinas – da geração centralizada e pequenos e médios empreendimentos da geração distribuida. Mas, como explica o diretor-regional da ABGD, o impasse com a Cemig não afeta as grandes usinas, porque elas são conectadas ao SIN (Sistema Interligado Nacional), mas afeta em cheio as pequenas e médias empresas que vendem e instalam os equipamentos para os consumidores produzirem a própria energia.
A Cemig sustenta que há regiões em que sua rede elétrica não tem capacidade técnica para novas conexões dos empreendedores fotovoltaicos da geração distribuída. Mas a concessinária garante que oferece aos investidores um mapa informando que os equipamentos podem ser direcionados para locais onde há condições imediatas de receber as novas ligações ou aguardar que “haja disponibilidade em regiões hoje saturadas”.
Walter Abreu afirma que desde o fim de 2022, sob a justificativa da falta de capacidade técnica, a Cemig vem negando o acesso a sua rede de energia para novas usinas de micro (de até 75kW) e minigeração (de 75kW a 5MW). Ele explica que, neste caso, a concessionária dificulta o comércio de equipamentos da energia fotovoltaica para o autoconsumo local (consumo próprio no mesmo endereço onde é consumida) e autoconsumo remoto (geração de energia para consumo próprio, mas em endereço diferente de onde é produzida), envolvendo instalações residenciais (em telhados das casas) e comerciais e em propriedades rurais, além de clubes de lazer e outros empreendimentos
“A Cemig alega que não há mais espaço em suas redes para conexão de novas usinas, seja para autoconsumo, com usina de quatro módulos de energia (2kW) para atender uma conta de R$ 200, ou usina de 5 MW, que é usina grande, que ocupa 15 hectares de solo. Em qualquer situação, ela nega a conexão, com o mesmo argumento: é preciso consultar o Operador Nacional do Sistema (ONS) e que enquanto não existir a resposta e uma a solução proposta, nenhum parecer de acesso será concedido”, relata Abreu..
A concessionária salienta que as firmas atuantes no setor são chamadas de “empresas integradoras”, que revendem e montam os sistemas de geração de energia solar fotovoltaica. Mas, diante da negativa da Cemig, não estão conseguindo instalar os sistemas de geração para o autoconsumo. “Portanto, as empresas estão zero de vendas”, pontua.
O diretor regional da ABGD diz ainda que, na semana passada, participou de reunião com a diretoria da Cemig. A companhia, afirma Abreu, informou que “enquanto não houver investimentos na rede de distribuição e nas subestações de energia, não haverá modificação no processo, vai continuar negando acesso a sua rede”. Ainda segundo ele, sempre que é procurada pelos investidores do setor no Norte de Minas, a companhia apresenta a mesma resposta, de que “(…) foi suspenso o prazo para elaboração do orçamento de conexão, pelo(os) seguinte(s) motivo(s): houve necessidade de avaliação da conexão da usina pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), referente ao impacto no sistema de alta tensão e na rede básica, em função do volume de geradores conectados e de solicitações de acesso em andamento no sistema da região”.
“Pelo que foi dito, só terá uma solução a médio e longo prazo. O problema é que, sem receita, nenhuma empresa vai permanecer funcionando e mantendo seus compromissos em dia”, alerta Abreu. Ainda segundo ele, diversas firmas estão paradas, em vias de demitir todos os funcionários e fecharem de vez, caso a conexão das usinas a rede de energia não seja reativada em curto espaço de tempo.
BUSCA POR SOLUÇÕES
O representante dos investidores cobra providências da própria Cemig e das autoridades governamentais para a busca de solução e impedir a desativação dos empreendimentos e o fim dos empregos. “A primeira coisa que pedimos é transparência porque a argumento, tecnicamente, é insustentável. O ONS publicou nota dizendo que, em resumo, a Cemig precisa resolver a situação”, salienta.
Por outro lado, Walter Abreu reclama que, ao mesmo tempo que afirma que não está autorizando o acesso à sua rede para novas usinas de micro e pequenos geradores de energia, a Cemig criou, em 2019, uma subsidiária para atuar na área de geração de energia distribuída, a Cemig Sim, concorrendo com as pequenas e médias empresas do setor. Na divulgação dos serviços da Cemig Sim, em sua página na internet, a companhia destaca que seu “plano de expansão prevê investimentos de R$ 3,25 bilhões até 2025.
Falta conexão para projetos de energia solar
A Cemig informou à reportagem do Estado de Minas que há regiões mineiras com falta de capacidade técnica para a conexão dos projetos fotovoltaicos de geração distribuída e que a informação foi repassada aos empreendedores do setor. A empresa alega também que disponibiliza mapa, informando as regiões onde há disponibilidade para novas ligações das usinas de geração própria de energia solar fotovoltaica.
“A Cemig informa que, atualmente, há regiões em que a rede elétrica não possui capacidade técnica de ligar novas conexões de empreendimentos fotovoltaicos de geração distribuída. Essa é uma informação passada de forma transparente em reuniões com representantes do setor e disponibilizada de forma pública no Mapa de Disponibilidade de Minigeração, solução pioneira no setor elétrico brasileiro que informa a disponibilidade de cada uma das subestações de energia da empresa para novas conexões. Com o Mapa, os interessados em realizar investimentos podem direcioná-los a regiões com disponibilidade imediata ou aguardar que haja disponibilidade em regiões hoje saturadas”, informou a empresa em nota.
A companhia também esclarece que a Cemig Sim é sua subsidiária voltada para o segmento de geração distribuída, mas que “ atua em mercado competitivo nas mesmas condições das outras empresas do setor”. A empresa informou também que executa o maior plano de investimentos de sua história, com destinação de R$ 18,4 bilhões para melhorias na distribuição de energia. “Um dos programas estruturantes do plano de investimentos e já em andamento é o Mais Energia, que está ampliando em quase 50% o número de subestações de energia em todas as regiões do estado até 2027 – algo fundamental para novas ligações. As melhorias já possibilitadas pelos investimentos permitiram que a Cemig fizesse mais de 74 mil conexões em 2022, ante 53 mil em 2021 e 34 mil em 2020.
A Cemig esclarece ainda que a Cemig SIM, subsidiária da companhia que atua no segmento de Geração Distribuída, atua em mercado competitivo nas mesmas condições das outras empresas do setor, que é regulado e fiscalizado pela Aneel. Ela e outras empresas do setor vêm direcionando investimentos para áreas com disponibilidade de conexão”.
MAIOR POTÊNCIA
A Associação Brasileira de Geração Distribuida (ABGD), informou que, em julho de 2022, a potência instalada em projetos de geração distribuída alcançou 12GW no Brasil. Minas Gerais chegou à liderança no país, com 2GW de potência instalada, à frente de São Paulo, com 1,6GW e Rio Grande do Sul, com 1,3 GW. Segundo a entidade, em 13 de abril do passado, Minas atingiu a marca de 1GW, depois de mais de 10 anos do lançamento da modalidade. E em cerca de 15 meses o estado dobrou sua capacidade de geração própria de energia. Os sistemas de geração distribuída estão presentes em 841 dos 854 municípios mineiros, sendo Uberlândia a cidade com maior volume de potência instalada, com 93MW.