Michel Temer soube domingo (22) à noite que Sérgio Machado, um antigo personagem da política brasileira, havia grampeado uma conversa com seu ministro do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR). Junto com as especulações sobre o conteúdo do áudio, ouviu um veredito: seria impossível manter o aliado no cargo.
Reportagem publicada pelo jornal Folha de S. Paulo nesta segunda-feira (23) com as falas do diálogo confirmou a previsão dos aliados de Temer.
Considerada inevitável, a queda de Jucá marca o naufrágio dos dois maiores artífices do impeachment de Dilma Rousseff, 36 dias depois de o primeiro algoz da petista, Eduardo Cunha (PMDB-RR), ter obtido a aprovação do pedido na Câmara.
Se Cunha deu início ao calvário de Dilma, aceitando a tramitação do pedido de afastamento, Jucá trabalhou para materializar em votos no plenário a insatisfação da classe política com a petista.
Habilidoso, comandou o rompimento do PMDB com o PT, assumiu a presidência do partido e atuou fortemente para trazer o PSDB, o PP e o PR para o lado de Temer.
O resultado desse trabalho conjunto é conhecido. Cunha sequer pôde participar da posse de Temer. Foi afastado do cargo e do mandato uma semana antes pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Jucá, por sua vez, não só foi à cerimônia como ganhou nela o título de ministro e homem forte do governo. Permaneceu 12 dias no poder.
Integrantes do PMDB próximos a Temer definiram a rápida passagem de Jucá pela Esplanada como a “crônica de uma morte anunciada”, numa alusão a um livro do escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez.
Investigado na Lava Jato, Jucá sempre foi alvo de especulações a respeito do impacto que desdobramentos da operação poderiam trazer para ele e para Temer.
Peemedebistas lembram que é a segunda vez que Jucá “tenta ser ministro”. A primeira foi no governo Lula, em 2005, quando deixou a Previdência após denúncias de irregularidades em contratos. Na época, ficou três meses no cargo. Um amigo do peemedebista diz que ele incorreu no mesmo erro duas vezes ao não reconhecer que “não sobrevive nessa altitude”.
CONFIANÇA
Sérgio Machado, o ex-presidente da Transpetro que negocia delação e apresentou o diálogo com Jucá como prova de sua vontade de colaborar com as investigações, é um velho conhecido do PMDB.
Ex-senador filiado ao PSDB, Machado foi líder no governo Fernando Henrique Cardoso. Os anos no plenário lhe renderam trânsito entre parlamentares de diversos matizes. Tornou-se um dos homens mais próximos ao hoje presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o patrono de sua indicação para o cargo na Transpetro.
Machado ocupava, até recentemente, o posto de “conselheiro” de Renan, e conversava frequentemente com o senador. Por isso, a alardeada disposição de Machado em entregar pessoas do PMDB é vista na sigla como uma “traição” só comparável à que “Delcídio do Amaral fez ao delatar os colegas do PT”.
Cunha acompanhou à distância a queda de Jucá. A uma pessoa próxima, avaliou que o presidente interino “pode se decepcionar” ao optar por sempre “ouvir as ruas”. “Um dia vão gritar ‘Fora Temer’.”
Folha de S. Paulo