De bumbum virado pra lua, o Heitor chegou! Chegou para ser o caçula da Mila e transformar o Arthur em pai. Por algum motivo, a vida quis que cruzássemos o caminho uma da outra e eu fico feliz por ter conhecido essa mulher forte de fala doce e olhar mais doce ainda.” Esse é um dos muitos relatos retirado do Instagram da médica ginecologista e obstetra Marcella Trópia. Ela trabalha na Santa Casa de Ouro Preto, na Região Central de Minas. A médica tem o costume de escrever sobre os partos que ela faz deixando o registro na rede social.
As narrativas são compostas por fotos e, às vezes, também tem vídeos, sempre emocionantes e que falam de um momento muito especial para as mulheres, o parto. “Nunca faço os relatos sem pedir a permissão das pacientes. Sempre que falo com elas que fiz um relato, um texto sobre a gestação, pergunto se posso colocar no meu Instagram e peço autorização para as fotos. E é engraçado que sempre pergunto, 'você quer ler antes?' e nenhuma quer. Elas desejam ter a surpresa de ler a publicação. E o feedback delas é sempre positivo”, conta Marcela.
Foi numa madrugada de 2018 que a ideia e a vontade de escrever surgiu, revelou a médica. “Eu estava de plantão na Santa Casa de Ouro Preto, grávida de 25 semanas e 3 dias da Luisa. Atendi uma paciente com a mesma idade gestacional que eu estava, só que ela evoluiu para parto”, conta. A prematuridade extrema da criança e o fato de a Santa Casa não ter Centro de Terapia Intensiva (CTI) marcaram Marcela. Para extravasar o sentimento, quando foi para o quarto ali mesmo no hospital, ela escreveu pela primeira vez. Desde então tomou gosto por registrar as histórias das salas de parto e não parou mais. Já foram tantas que ela até perdeu a conta.
As postagens da médica fazem sucesso e inspiram gestantes. Foi o caso de Roberta Fernandes. “Eu a procurei por acompanhá-la no Instagram e ver cada relato um mais lindo que outro. É tanto carinho que ela tem! Quando acho que ela não tem mais onde expressar sentimento diferente para falar de um parto, ela me surpreende”.
Sem palavras! Assim ficou Roberta ao ler o relato que a médica escreveu para ela. Roberta afirma que Marcella contou exatamente a emoção que sentiu e toda vez que lê as palavras da médica ela revive a emoção do momento em que conheceu o pequeno Murilo. O registro da história da Roberta revela uma mulher forte amparada pelo marido Juliano que não faltou a uma consulta do pré-natal, era participativo e incentivador dos desejos da Roberta.
“Quando Roberta entrou em trabalho de parto, eu vibrei, eles estavam tão eufóricos por conhecer o rosto de quem já amavam tanto que meu cansaço de um quase 48 horas acordada se dissipou. A aura daquela sala de parto era de paz, ansiedade e força. Quem vê a delicadeza da Roberta não imagina a leoa que ela se tornou para parir Murilo. Fácil? Nunca é. Seu corpo se movia na fisiologia do trabalho de parto, Juliano a olhava com tanta admiração e devoção. Quando Murilo chegou, às 19h18, o sorriso da Roberta e as lágrimas do Juliano inundaram a sala e emocionaram a todos. Ela conseguiu, ultrapassou seus limites de dor, força, cansaço e trouxe seu filho ao mundo, forte e saudável!”, diz o relato de Marcella. E Juliano não poupa elogios à esposa: “Roberta foi uma guerreira, mesmo com as dores intensas ela suportou até o final e o nosso filho nasceu muito bem”.
Tudo parece cooperar para que as narrativas da médica fiquem mais emocionantes e os partos inusitados também. De acordo com Marcella, uma paciente ganhou o filho ao som de música tocada pelo marido em um teclado. Ela desejava muito o parto normal, mas não atingiu a dilatação necessária e precisou fazer uma cesariana. Segundo a médica a paciente ficou muito frustrada e visivelmente triste.
“O marido dela, que é músico, teve uma sensibilidade muito grande. Ele me chamou em separado e me perguntou: 'Dra, eu posso trazer meu teclado?' E eu: “Mas a gente vai entrar (com o instrumento a sala) na cesárea?' Ele disse: 'É, eu acho que ela vai gostar'. Eu falei 'pode'. Não pedi permissão para ninguém, levei até uma bronca por causa disso. Ele foi à casa dele correndo, buscou o teclado e durante toda a cirurgia tocou a música preferida dela dentro da sala de parto. Aquilo foi importante pra ela”, avaliou a obstetra.
O engraçado disse a médica, é que a surpresa teve dobradinha. A paciente engravidou de novo, porém o marido não quis deixar passar o nascimento da criança sem música também, então ele pediu novamente que Marcella liberasse o “show”. O bebê nasceu ao som de violão, de parto normal debaixo do chuveiro.
CUMPLICIDADE
Durante o acompanhamento da gravidez, a médica compartilha com a gestante as vitórias e os problemas dela. Pode ser uma promoção no trabalho ou a perda de um ente querido no meio do pré-natal. Esse foi o caso da médica Catarina Milagres. Ela perdeu a irmã caçula quando estava no quarto mês de gravidez.
Com essas palavras da colega, Catarina aliviou o coração: “Toda mãe se preocupa em não prejudicar seu filho com eventos que lhe causam tristeza e angústia, e eu sempre digo que nossos filhos são fortes e entendem que ser humano é viver todas as emoções e isso não faz mal. Eles sentem nosso amor e isso sempre será o sentimento superior a todos os demais”.
A percepção da orientação da médica e a cumplicidade com o marido levaram a um resultado surpreendente para Catarina. “Algumas horas em casa acompanhadas pela maravilhosa fisiologista Giselle Florêncio levaram a um parto natural lindo em que Hugo foi amparado pelo pai. E eu e a pediatra terminamos de luvas limpas só assistindo à fisiologia acontecer!”, comemorou Marcella.
SUSTOS
Pilates, yoga, dança… a Julieta Pereira se preparou e muito e já estava quase lá. A maternidade sempre foi o sonho da Julieta que, aos 40 anos, conseguiu realizar, passou toda a gestação muito bem e chegou à beira de um parto normal. “O sol foi se pondo e chegamos aos 9 centímetros de dilatação! Vitória! Vicente está quase chegando. Julieta estava exausta, precisava descansar e a analgesia foi um refúgio”, comemorava a médica. De repente, explica Julieta, “me assustei com a dra. gritando: 'cesárea de urgência'. Parecia coisa de filme, acendendo as luzes, médicos, enfermeiras entrando na sala, e eu ali, deitada, sem entender nada. A Marcella, em 15 segundos, tirou meu filho. Só lembro dele roxo e sem chorar, mole. Levantava a cabeça à procura do meu filho enquanto era costurada, não ouvi nem um sonzinho de choro… ah meu coração. Hoje, o Vicente tem 1 ano e 2 meses, e nenhuma sequela do ocorrido na hora do parto”. Conta aliviada a mamãe Julieta.
Para Julieta, Marcella escreveu: “Vida é assim! E acredito que os filhos vêm para nos mostrar que ela é cheia de curvas, mas quando estamos no caminho certo, as curvas nos levam ao mesmo final feliz. Ver uma mãe de 40 anos que sempre sonhou com a maternidade carregar seu filho é sem dúvida, o ápice da minha profissão”.
Além do profissionalismo, o que leva a Marcella Trópia pensar no bem-estar de suas pacientes é o fato de ser mãe de duas meninas, revela. ”Presenciar o crescimento das mulheres no pré-natal e a força das minhas pacientes na hora do parto, independente da via de parto…você percebe o quanto o amor de mãe transforma, o quanto ele dá força, e essa força é arrebatadora”, diz.