A morte de um pequizeiro quase centenário virou caso de polícia e alvo de investigação por parte de órgãos ambientais em Bocaiúva, no Norte de Minas. A suspeita é que a árvore tenha sido envenenada.
O caso virou um dos principais assuntos nas rodas de conversas e nas redes sociais na cidade de 50,2 mil habitantes.
Situada a 376 quilômetros de Belo Horizonte, a cidade é conhecida por ser a terra do sociólogo Herbert Souza, o Betinho, do irmão dele, o cartunista Henfil e do lendário ex-vice-presidente da República José Maria de Alkmin.
A árvore envolvida na polêmica fica na praça que leva o seu nome, a Praça do Pequi, situada no Bairro Esplanada, perto do Centro da cidade.
O prefeito de Bocaiuva, Roberto Jairo Torres (Avante), o Robertão, foi quem pediu a investigação sobre o suposto envenenamento da árvore. Ele afirma que na terça-feira, ao retornar do distrito de Engenheiro Dolabella, percebeu que as folhas do pequizeiro ficaram secas misteriosamente, "de um dia para outro".
Conforme mostrou série de reportagens do Estado de Minas, nos últimos anos, centenas de pés de pequi no Norte de Minas foram dizimados por causa do ataque de uma praga, a "broca-do-tronco do pequizeiro".
No entanto, o prefeito disse que já há vestígios de que o pequizeiro da praça do Bairro Esplanada tenha atacado pela praga, sobretudo, devido ao fato de as folhas da planta terem secado rapidamente.
Segundo ele, a suspeita de "envenenamento" foi levantada porque foram verificados sinais de que houve perfuração do tronco da árvore com o uso de alguma ferramenta.
Torres informou que pediu à Secretaria de Meio Ambiente e à Polícia Civil que investiguem o possível crime ambiental. Ele afirma que não tem ideia de quem poderia praticado o "atentado contra a natureza", desconhecendo o motivo da ação.
"Não estamos aqui para fazer julgamentos. Mas, se realmente um ser humano tem a capacidade de cometer uma atrocidade desta, isso é muito lamentável", disse Robertão, destacando a importância ambiental e econômica do pequizeiro, a árvore-simbolo do Cerrado.
A espécie nativa também é reconhecida por lei estadual como a "árvore-símbolo de Minas Gerais".
Roberto Torres destaca que a Prefeitura de Bocaiuva investe na conscientização ambiental e na preservação das espécies nativas do Cerrado. "Já plantamos e distribuímos mais de 2 mil mudas de pequizeiro. Sempre indicamos o plantio de mudas de pequi nos processos de compensação ambiental. O pequizeiro e árvore-simbolo da resistência no sertão", afirmou.
Ele informou que um outro pequizeiro será plantado na Praça do Esplanada.
A Prefeitura de Bocaiuva divulgou nota informando as providências adotadas para apuração sobre a suspeita do "envenenamento" do pequizeiro quase centenário.
A morte da árvore virou tema de debate entre os moradores nas redes sociais. "Quantos e quantos (pés de pequi) já viraram carvão. Para fundição, siderúrgica, churrasco….", comentou um morador. "(Agora) é correr atrás: recuperar o Cerrado", completou outro internauta.
Um perfil nas redes sociais que se identifica como "Simples professora" sugeriu a realização de estudos científico para saber qual foi realmente a causa da morte do antigo pequizeiro da praça de Bocaiuva. "Precisamos de um técnico da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) ou de outro órgão ambiental para confirmar o que houve realmente com nosso pequizeiro", enfatizou.
Ataque da praga do tronco-do-pequizeiro
Produtores, técnicos e pesquisadores travam uma luta Norte de Minas contra a broca-do-tronco do pequizeiro. Conforme revelou reportagem do Estado de Minas, estimativas apontam que desde que foi identificada, há oito anos, a larva colocou fim à vida de milhares de árvores na região, ao se alimentar da parte lenhosa do tronco (cerne). Com isso, impede a passagem da seiva, que alimenta a planta, levando-a a parar de produzir, até provocar sua morte.
"Se fosse em humanos, é como se a lagarta, ao longo do tempo, cortasse as veias que levam o sangue e oxigênio para todas as partes do corpo. Daí a morte da planta por partes, desde as raízes até os galhos mais altos, pois, se não recebem a seiva, eles vão morrer", explica Fernando Cardoso de Oliveira, técnico da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG).
Como maneira de amenizar os prejuízos e salvar a espécie nativa, surgiu a iniciativa de produzir mudas da planta para recompor os pequizais. Mas a grande esperança no combate à broca do pequizeiro vem da ciência e da tecnologia.
Está em andamento uma pesquisa que visa desenvolver uma forma eficaz de combater e evitar a reprodução do inseto que ataca as árvores do fruto símbolo do cerrado, também conhecido como o "ouro" ou a "carne do sertão".
O estudo é coordenado por Antônio Cláudio Ferreira Costa, pesquisador do Laboratório de Entomologia da unidade da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado de Minas Gerais (Epamig) em Nova Porteirinha, no Norte de Minas.
Segundo ele, o trabalho consiste em um estudo do controle da população da broca do pequizeiro, "usando princípios agroecológicos e a colaboração dos produtores rurais proprietários dos pequizeiros, dos catadores de pequi e dos extensionistas da Emater-MG".
"O objetivo é extrair a substância que a mariposa fêmea libera para atrair os machos (feromônio sexual feminino) e utilizá-la como isca em armadilhas para capturar os machos e, assim, reduzir a multiplicação do inseto", explica Costa.
O pesquisador salienta que o estudo foi iniciado em 2019, após a Emater-MG ter procurado o Laboratório da Epamig em Nova Porteirinha, no chamado Campo Experimental do Gorutuba. O experimento tem financiamento do Fundo Pró-Pequi de Minas Gerais, com o apoio das prefeituras dos municípios atingidos pela broca.