“Procurem no YouTube pelo pastor Claudio Duarte. Gênio!”, escreveu o humorista Fábio Porchat, do Porta dos Fundos, em seu Twitter há dois anos. O religioso achou que era uma piada. Porchat explicou a ele, na rede: “Não foi piada, não. Não sou religioso mas achei, pelos vídeos no YouTube, que o seu jeito de pregar ajuda os casais”.
“Ele tem um senso da realidade, não é fanático”, diz Porchat, hoje amigo “virtual” do pastor, que já foi a uma de suas apresentações, no Rio -o religioso vive em Xerém, no interior do Estado.
Duarte é sucesso na internet. Tem 2,7 milhões de seguidores no Facebook e vídeos com 2,5 milhões de visualizações no YouTube, com títulos como “Pastor Claudio Duarte Fala Sobre Sexo Anal e Motel”, “O Que a Masturbação Faz com o Ser Humano”, “Falhei Na hora H” e “Não Matarás a Sua Sogra”.
Ele conquista casais basicamente fazendo piadas cheias de referências sexuais sobre o casamento, que define como “a única prisão da qual você sai por mal comportamento”. “Jesus é tão esperto que falou: ‘Pai, eu assumo essa responsabilidade de salvar a humanidade. Eu vou lá na Terra. Vão cuspir ‘ni mim’, vão conspirar contra mim, vão querer me matar, vão me colocar uma coroa de espinhos. Eu morro. Agora, casar… essa loucura eu não faço, não”, diz ele num dos vídeos. “Imagine Jesus com uma missão a cumprir e umas crianças remelentas andando atrás dele, uma mulher perturbando a cabeça dele. Não ia dar certo.”
Aos 46 anos, ele diz que começou a ficar conhecido há cerca de cinco, primeiro entre evangélicos, depois atingindo o público não religioso. As primeiras piadas foram para jovens na pequena igreja em que dava aulas, em Santa Cruz da Serra, no RJ.
“Quando passei a trabalhar com o assunto família, levei o humor, alguém gravou, colocou na internet e aí explodiu”, diz ele à repórter Letícia Moriantes de um show para 850 pessoas na Assembleia de Deus de Alphaville, na Grande São Paulo.
Além de fazer pregações bem-humoradas, pelas quais não cobra, o pastor criou um show de stand-up comedy que leva para igrejas e teatros. As piadas sobre amor e sexo, sua aparição em programas como o do apresentador Danilo Gentili e sua amizade com figuras pop como Porchat lhe renderam problemas. “Sofro um tipo de discriminação chamado ‘humorfobia'”, brinca, com a voz sumindo após seis apresentações em um fim de semana. “Muitos religiosos não sabem lidar com o humor.”
“Hoje na plateia vou falar sobre impotência sexual”, segue. “Tenho que tomar cuidado. Se não for delicado, vou arrebentar os caras.” Ele repete que tudo o que diz é baseado em preceitos bíblicos e que seu humor é “sério e limpo”. “Não entendo por que o homem se sente desconfortável ao tratar de um tema sobre o qual Deus se sente à vontade. E aí é que eu gosto da Bíblia. Porque, se tem uma coisa de que a Bíblia fala é de sexo! O livro dos cânticos de Salomão parece um manual. O sujeito chama os seios da mulher dele de uva. O que você faz com a uva?”.
Nos shows, ele tira dúvidas, fala de problemas entre casais e orienta: não é pecado apimentar o casamento com uma fantasia ou uma lingerie -mas sem pornografia e exageros. “Tem gente que termina com uma terceira pessoa na cama. Criou-se uma ilusão de que sexo pra ser quente tem que ser sujo. Mas aprendi biblicamente que uma mulher pode ser cheia do espírito de Deus e ser um vulcão na cama. O homem ser conhecedor da Bíblia e ser o cara!”
Casado há 23 anos com Mery e pai de dois filhos, ele diz que o próprio casamento é um laboratório. “Ela evita ir nos eventos comigo. Como falo da nossa vida, ficam olhando pra ela. A projeção tira um pouco a privacidade.”
Sua abertura faz com que muita gente o procure pessoalmente. “Esses dias me deparei com algo que nunca tinha ouvido falar. Uma moça casou com um rapaz que tem uma doença chamada micropênis. Ela não sabia, porque nós pregamos a castidade.”
Admite que jovens religiosos podem se casar cedo porque deixam o sexo para depois da união. “Digo: ‘Cara, se você souber a quantidade que nós, casados, fazemos, verá que é um péssimo motivo!”.
Está criando um curso para noivos com um questionário pré-nupcial. “Tem que perguntar: ‘Depois de casarmos, quantas vezes você quer sua mãe aqui em casa?’. O papinho de namorado acaba! No começo os bichos são pequenos: minha pombinha, meu gatinho. Depois, crescem: sua anta, seu porco!”, diz, citando piada do padre Léo, católico morto em 2007 que Claudio diz ser sua inspiração.
Ligado à Igreja Batista, ele está criando seu próprio ministério em Xerém, o Projeto Recomeçar. “Já recasamos dois casais divorciados.” Transita entre diferentes vertentes do cristianismo e se apresenta inclusive em igrejas católicas. Faz autocrítica: “Nós [evangélicos] recebemos o preconceito que oferecemos. Vivemos um revide. Somos preconceituosos com tudo. Eu não me acho, mas digo ‘nós’ porque represento a classe. O brasileiro é intolerante ao extremo. Somos uma sociedade preconceituosa. E isso se reflete na igreja”.
O pastor teve “um irmão de criação negro e gay que morreu há 15 anos. Aprendi com ele a amar e a não segregar. Tenho horror a discurso de ódio.” É a favor de direitos iguais para os homossexuais, apesar de “não concordar com a prática”. “Na visão bíblica, é pecado. Não tenho como negociar. Pra caminhar conosco no ministério tem que ter um protocolo. Mas, fora, o direito tem que ser para todos. Bater num gay, ‘tacar’ pedra numa menina [praticante do candomblé, apedrejada no Rio], para um cristão isso é inconcebível.”
Diz que é a favor de Estado laico, mas não critica diretamente a bancada evangélica no Congresso. “Acho legal. É importante em todo segmento ter alguém que reproduza o comportamento cristão.” Abaixando a voz até quase um sussurro, faz uma ressalva. “Agora, se as pessoas que se dizem cristãs agem como cristãs é outra coisa. O problema é quando quem se diz religioso tem comportamentos piores do que quem não é. Essa turma está queimando o filme de Jesus.”
Evita comentar sobre figuras religiosas polêmicas, como o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). “Prefiro não falar nada. Ele está vivendo aí, e eu acredito em lei de semeadura: ela é opcional, mas a colheita é obrigatória. Você escolhe o que planta, mas não o que colhe.”
Diz achar um absurdo tentativas de proibir piadas com religião, como o projeto de lei do deputado estadual Fábio Silva (PMDB-RJ), que não chegou a ser aprovado. “Enquanto cristãos tiverem um estilo de vida que não combina com a palavra de Deus, tem que ter gente pra denunciar. Se for um humorista, que seja.”
“Não gosto da agressividade de muitos vídeos do Porta do Fundos, por exemplo, mas entendo que o intuito não é denegrir Deus, mas dizer para os crentes: criem vergonha na cara. Parem de fazer da religião uma desculpa para manipular as pessoas”, conclui, antes de sair para a sua apresentação da noite