As trincas ao longo das Avenidas Presidente Juscelino Kubitschek e Tereza Cristina, na altura do Bairro Prado, Região Oeste, e na Rua Dom Joaquim Silvério, no Coração Eucarístico, Região Noroeste de
Belo Horizonte, se abriram em função da movimentação da laje de cobertura do Ribeirão Arrudas, segundo a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).
Em resposta ao Estado de Minas, a Subsecretaria de Zeladoria Urbana (Suzurb) da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que “as trincas se dão na junção da laje de cobertura do Ribeirão Arrudas com a estrutura do pavimento, com aumento gradual da espessura por fadiga, esborcinamento, etc”.
A PBH, que classifica as trincas como “anomalia”, afirmou que o problema será tratado e que a Suzurb está “testando materiais técnicos e economicamente mais viáveis para garantir a estanqueidade da estrutura existente e conforto e segurança ao rolamento”. Não foi informado o prazo para conclusão das obras.
Perguntada se havia outros locais da cidade com o mesmo problema, além das duas avenidas indicadas inicialmente pela
reportagem, a PBH informou que até o momento não foram identificados outros problemas do tipo.
Apesar disso, nas
fotos enviadas pela prefeitura, há imagem de intervenção em um trecho da Rua Dom Joaquim Silvério, no Coração Eucarístico. A reportagem do EM também encontrou fendas semelhantes na Avenida dos Andradas, em frente à Praça da Estação, na Região Central de Belo Horizonte.
Trincas preocupam comerciante
Tertuliano Rodrigues é comerciante e trabalha há mais de 30 anos nas margens da Avenida Tereza Cristina. Segundo ele, as trincas existem há cerca de oito anos e vêm aumentando com o passar do tempo. “Me preocupo, pois acredito que pode afundar, igual aconteceu para baixo do Parque Municipal, pelo peso. Colocou asfalto aqui, aumentou uma pista, mas tem essa preocupação.”
O comerciante informou também que parte da pista nas proximidades cedeu há alguns anos e ele teme que volte a acontecer. “Na curva, lá embaixo, esquina com a Rua Prado, cedeu. Aqui, eles melhoraram a obra, taparam, por causa disso. A obra, em si, ficou boa, mas essas rachaduras estão aumentando”, falou.
A profundidade e largura das rachaduras também representa risco para os motociclistas, já que, por sua largura e profundidade, podem ocasionar quedas ou rasgos nos pneus dos veículos.
'É preciso entender a causa desse movimento'
A reportagem do
EM ouviu Clemenceau Chiabi, perito em avaliações em engenharia e presidente do Conselho do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia, que analisou os problemas por meio de fotos e vídeos enviados pela reportagem. Ele também teve acesso às respostas da Prefeitura de Belo Horizonte, às quais criticou.
“Achei a resposta da Prefeitura extremamente vaga, do ponto de vista técnico. Ela fala de uma suposta fadiga, mas eu não sei se ela fez teste de fadiga, se não fez. Eu e nenhum outro engenheiro vamos te falar se isso é perigoso, se não é, sem fazer uma análise, uma vistoria, sem verificar o projeto.”
A reportagem solicitou à PBH cópias de laudos que expliquem a causa e as possíveis soluções para o problema, mas não obteve resposta.
“É necessário fazer um laudo técnico muito aprofundado, porque nós estamos falando do Ribeirão Arrudas, que, quando chove, tem um volume de água muito grande. Nós estamos mexendo com uma avenida que foi feita por cima desse córrego, e a gente tem que ir na causa e não na consequência. Tapar o buraco é consequência. A gente tem que entender porque é que mexeu”, afirmou Clemenceau.
Risco à população
O engenheiro também comentou as técnicas e o termo utilizado pela prefeitura. “Falar que vai usar uma técnica experimental para tapar buraco? Não é por aí, não. Por que é que mexeu? Por que abriu a fenda? Não é nem trinca, é fenda, porque trinca é menor A prefeitura falou ‘é fadiga’. Tá. Com base em qual estudo? Em qual verificação? Todo mundo conhece como se movimenta a terra, como se movimenta o asfalto. Por que usar um material experimental? Eu não entendi”, disse ele.
Segundo Clemenceau, sem analisar um estudo técnico, qualquer análise definitiva poderia estar equivocada. Apesar disso, ele fez um alerta. “Se tiver um problema na estrutura do canal, que está movimentando, por um problema estrutural, aí pode colocar em risco a população. Agora, se for simplesmente uma trinca de encharcamento indevido, que deu uns furinhos e entrou água ali, embora não seja essa característica, pois ela é muito retinha, paralela, é outra coisa”, explicou o engenheiro.
Chiabi cobrou uma explicação melhor do problema, dizendo que existe um cálculo para determinar a fadiga. Segundo ele, é possível determinar com quantos ciclos de movimentos haverá a quebra e nas avenidas não têm ciclos de movimento.
“Na minha opinião, primeiro, a prefeitura tem que fazer um laudo muito contundente para explicar a origem do problema. E depois, sabendo da origem, fazer um projeto de recuperação para mitigar o risco. Falar ‘é causado, provavelmente, por fadiga, então vou usar um material experimental’ para mim está sendo muito raso. Talvez a gente não tenha o conhecimento que eles têm lá, mas eu acho que eles poderiam explicar a causa e eles não explicaram”, falou.
Fadiga
O engenheiro questionou, ainda, a afirmação da PBH sobre a causa das rachaduras ser fadiga. Ele explicou o funcionamento desse tipo de ruptura. “Fadiga é quando a gente vai quebrar um arame e fica dobrando para cima e para baixo, a fadiga é o número de ciclos desse movimento, até quebrar”, contou.
“Não me parece nenhum tipo de fratura por fadiga, porque nenhum tipo de fadiga vai trincar, vai esfarelar. É completamente diferente, se você pensar tecnicamente”, disse. “Calcular fadiga em concreto é um assunto um pouco mais complicado porque você não tem ciclos de movimento repetitivos ali para gerar fadiga. Não é assim tão simples”, completou.
Clemenceau Chiabi destacou, ainda, que soluções paliativas podem se tornar desperdício de recursos. “Se você não tratar a origem, vai fazer um paliativo experimental na causa e depois de uns dias vai estar trincado outra vez. Vai ser jogar dinheiro fora”, finalizou.
Procurada para repercutir as declarações de Clemenceau, a Prefeitura de Belo Horizonte afirmou que “a Subsecretaria Municipal de Zeladoria Urbana (Suzurb) esclarece que também conta com uma equipe multidisciplinar constituída por especialistas do seu corpo técnico, além de empresas especializadas contratadas para este fim”.