Cento e nove homicídios na conta. Os mortos, entre eles traficantes, ladrões, homicidas e estupradores, foram executados quase sempre da mesma forma: com um tiro na nuca. Todos eles vítimas de Josenildo Alves da Silva, de 28 anos, o matador de Ceará-Mirim, no Rio Grande do Norte, integrante de uma milícia conhecida como “justiceiros”, que, segundo a Polícia Civil, assassinava outros criminosos da cidade por conta própria ou sob encomenda.
De fala mansa e jeito quieto, o matador passou desapercebido pela polícia por mais de um ano no bairro Santa Cruz, em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde morou e trabalhou desde que fugiu do Nordeste. Ele deixou Ceará-Mirim quando a Força Nacional conseguiu identificar e prender outros 15 integrantes da milícia.
Josenildo da Silva estava tão confiante de que não seria encontrado, que nem se deu ao trabalho de falsificar seus documentos – prática comum entre foragidos da Justiça. O criminoso ainda conseguiu um emprego como vendedor em uma loja de eletrodomésticos. A farsa só acabou no dia 12 do mês passado, quando a Força Nacional, por meio de interceptações telefônicas, descobriu a localização do miliciano e informou a Polícia Civil de Minas Gerais. O matador foi preso no próprio local de trabalho, como conta o delegado Felipe Freitas, que coordenou o caso no Estado e apresentou o bandido nesta segunda-feira (11).
“Quando ele foi preso estava trabalhando numa loja de eletrodomésticos próximo ao local onde residia. Ele incrivelmente estava usando sua identidade normal, não estava com nenhum documento falso. Ele então foi contratado por essa loja e estava trabalhando como vendedor normalmente”, afirma.
O delegado explica que o matador se aproveitou de uma falha no sistema de identificação nacional, que não tem uma rede interligada entre os Estados, para conseguir uma nova identidade original em Minas e esconder dos empregadores seus antecedentes criminais.
“Ele se aproveitou de um gargalo nacional que é a questão da identificação, pois cada estado tem o seu sistema de identificação, o que dificulta muito as forças policiais. É preciso uma política nacional de identificação única para coibir esse tipo de ação. Existem indivíduos por aí que têm identidades diferentes em São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo. Se você consulta no sistema a identidade de Minas Gerais, o sujeito pode ter passagens pela polícia, mas se você consulta em São Paulo ele não tem passagem nenhuma”, ressalta.
Matador diz que só indicava as vítimas
Quesitionado pela Polícia Civil de Minas Gerais sobre os crimes cometidos em Ceará-Mirim, o matador não negou envolvimento com a milícia, mas disse que ele apenas identificava os alvos do grupo de extermínio.
“Ele tenta dizer que sua participação era de menor importância, que ele apenas identificava onde as vítimas estariam e repassava ao grupo que ia lá e executava. Mas há informações de que ele efetivamente participou dessas execuções, todas bárbaras. Os indivíduos muitas vezes eram imobilizados e executados com tiros na nuca”, salienta o delegado responsável pela prisão.
Milícia desarticulada
De acordo com o delegado Felipe Freitas, 15 integrantes da milícia foram presos em uma operação da Força Nacional para combater o grupo e outros seis em uma segunda fase. Entre os presos estão dois policiais militares do Rio Grande do Norte. Todas as prisões ocorreram no Nordeste.
“Essa quadrilha foi desmantelada uma vez que seus líderes estão todos presos. Aqueles que detinham o poder sobre esse grupo de justiceiros estão todos presos”, constata.