A Polícia Civil investiga três mortes de homossexuais registradas em menos de um mês em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Todas as vítimas utilizariam aplicativos de relacionamentos para conhecer novas pessoas e já teriam marcado encontros por intermédio deles. A corporação apura uma possível ligação entre dois casos e não descarta a hipótese de homofobia como motivação.
A primeira vítima foi Guilherme Duarte Pagotto, 23, que desapareceu após sair de casa na madrugada do último dia 24 para encontrar uma pessoa que teria conhecido por meio de um aplicativo. Dois dias depois, o corpo dele foi encontrado às margens da rodovia MGC–455, no KM 3, com um lençol enrolado no pescoço, o que levanta a possibilidade de estrangulamento. Também há suspeita de que um carro incendiado localizado na cidade de Veríssimo, na mesma região, no dia 31, pertencia ao jovem.
“Ele vinha marcando muitos encontros ultimamente pelo celular, e eu falava para ele ficar quieto, para não sair com quem não conhecia, nunca gostei desse negócio. Estou sofrendo demais, porque, além de meu filho, ele era meu melhor amigo, meu companheiro”, afirmou a mãe de Pagotto, Darci Duarte, 54, que perdeu o único filho.
O segundo caso foi registrado no dia 31 de outubro, quando o cabeleireiro Maximiliano de Oliveira, 47, foi encontrado morto no salão onde trabalhava, no bairro Osvaldo Rezende. Ele estava com um fio elétrico enrolado no pescoço e, de acordo com a família, também usava um aplicativo de paquera e trocava mensagens com pessoas que conhecia pelo celular.
A vítima mais recente é o dentista Helton Ivo Botelho, 36, que desapareceu no último dia 10, depois de sair de casa de carro – encontrado dois dias depois com a porta aberta e sujo de barro. O corpo do homem foi localizado no domingo passado, próximo a um rio na rodovia MGC–455, mas no KM 42. Um dos suspeitos do crime, preso nesta semana, contou à Polícia Militar (PM) que estrangulou o dentista e o matou após terem marcado um encontro por aplicativo.
Segundo a Polícia Civil, o delegado Vitor Dantas, que investiga os três casos, não descarta que os crimes contra Pagotto e Botelho tenham relação entre si, devido ao fato de que as duas vítimas estariam usando o mesmo aplicativo, o Badoo, e à semelhança no modo de agir dos criminosos. Ambos estão sendo investigados como homicídios.
No entanto, para o delegado, não há indícios de assassinato no caso de Oliveira, visto que, no local onde o corpo foi encontrado, não havia sinais de violência. Em um primeiro momento, ele trabalha com a hipótese de suicídio, mas a família do cabeleireiro discorda. “Conheço meu irmão, a crença dele, e sei que ele não faria isso, e tinha muito sangue próximo ao corpo dele, que estava no chão, e não dependurado. Ele já tinha me falado que usava aplicativo, e sempre achei perigoso”, contou a irmã da vítima, Ana Paula de Oliveira, 40.
Situação preocupa comunidade LGBT
As mortes dos homossexuais geraram preocupação na comunidade LGBT de Uberlândia, que acredita que os casos tenham sido motivados por homofobia. Os crimes foram registrados dias depois da Parada LGBT da cidade, que ocorreu em 23 de outubro.
“Os três estão relacionados com aplicativos de encontros, foram muito próximos uns dos outros e aconteceram de forma semelhante. A população LGBT de Uberlândia está muito assustada”, disse Marcos André, coordenador do Núcleo de Diversidade Sexual (Nuds) e fundador da Associação Homossexual de Ajuda Mútua (Shama).
Segundo ele, homicídios motivados por preconceito já aconteceram no município antes, mas nunca teriam tido tantos em um mesmo período. “Esses assassinatos deixam as pessoas preocupadas, porque muitas fazem uso de aplicativos de encontro. Nossa orientação é tomar muito cuidado, não sabemos quem está do outro lado”, disse André.
Preconceito. Conforme o coordenador do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marco Aurélio Máximo Prado, a homofobia no Brasil é legitimada pelas instituições e pela cultura, uma vez que, para ele, os crimes não são investigados como deveriam e não são considerados juridicamente como crimes de ódio.
“O preconceito tem a capacidade de impedir que uma pessoa pense sobre o outro como humano e detentor dos mesmos direitos, desumaniza o outro e mantém hierarquias de poder e violência como sendo legítimas na cultura”, afirmou. Segundo o professor, a melhor forma de prevenção desse tipo de violência é a criação de políticas públicas que valorizem e produzam direitos para as pessoas LGBT e combatam o preconceito. (RM)
Versão
Homicídio. A Shama está ajudando a família de Maximiliano de Oliveira e aguarda o laudo para apresentar ao delegado Vitor Dantas argumentos de que ele não teria cometido suicídio.