Projeto que ordena e cria critérios para o crescimento e a ocupação do solo da cidade, o Plano Diretor de Belo Horizonte vem sendo gestado desde 2014, quando aconteceu a última Conferência Municipal de Política Urbana, e desde 2015 aguarda aprovação em votação na Câmara.
A história ganhou mais um capítulo nesta sexta (29), quando a administração do governo Kalil apresentou e enviou um segundo texto substitutivo para apreciação dos vereadores belo-horizontinos.
Em workshop realizado no prédio da Prefeitura, a secretária de Política Urbana, Maria Fernandes Caldas, reforçou que o novo projeto mantém vigentes todas as deliberações encaminhadas originalmente pela última Conferência Municipal de Política Urbana- participativa, a elaboração do projeto reuniu cerca de 6 mil pessoas de diversas esferas da sociedade civil organizada.
Texto simplificado
As principais mudanças, explica Maria Caldas, são relativas a simplificação do texto. “Ficamos quase 18 meses estudando o projeto”, diz, completando que o resultado é um trabalho mais enxuto. Para se ter ideia, as tabelas que orientam o Plano Diretor foram reduzidas em 75% e os mapas em 30%. “Assim as pessoas podem compreender melhor o plano”, garante.
A secretária garante que haverá empenho da PBH no sentido de aprovar o projeto, no entanto destaca que não há uma expectativa de quanto tempo levará para que isso aconteça. Vale lembrar, o Plano Diretor está para ser votado desde 2015, ainda na administração Márcio Lacerda. A expectativa é que exista resistência, principalmente do mercado imobiliário. “O que estamos propondo é uma mudança quase de cultura. É natural que o mercado queira entender, queira estudar seus impactos. Acreditamos que com o diálogo vamos vencer”, expõe a secretária.
Resistência
Questão mais polêmica proposta pelo Plano Diretor é a criação da outorga onerosa. A administração explica que, em todo município, será estabelecido um coeficiente de aproveitamento equivalente a um. Isso significa, nas palavras de Maria Caldas, que “pode-se construir em metros quadrados o equivalente a área de terreno”. Caso o empreendedor queira “construir mais que isso, ele compra esse direito da sociedade”. Esta cobrança é a chamada outorga onerosa.
A arrecadação proveniente dessa cobrança iria para dois fundos: um de desenvolvimento urbano de centralidade e outro de habitação, sendo investido em urbanização, infraestrutura, melhoria habitacional e construção de moradia.
Maria Caldas detalha que todo o recurso é administrado pelo município, mas sua destinação é definida pelo Conselho Municipal de Habitação e Conselho Municipal de Política Urbana – órgãos que têm participação da sociedade civil organizada.
A ideia, defende a secretária, é que requalificar áreas que sofrerão adensamento a suportar esse novo contingente urbano. Além disso, “parte do recurso será necessariamente aplicado na construção de habitação de interesse social”. A expectativa é reduzir o volume de pessoas que vivem em moradias em situação precária. “São 93 mil pessoas em áreas de assentamento precário, fora as favelas”, estima.
Especulação
Tratando como improvável a hipótese de um aumento no valor dos imóveis por conta da cobrança da outorga onerosa, a secretária defende que essa cobrança já era feita. Explica-se: se há dois lotes iguais e em mesma região, mas um deles têm capacidade de edificação superior, é natural que os loteamentos, embora iguais, tenham valor diferente.
Essa valorização do imóvel, examina Maria Caldas, independe das ações do proprietário, que se beneficia das políticas urbanas públicas. O que o Plano Diretor faz, portanto, é equiparar estes valores. “A prefeitura vai se apropriar da especulação”, resume ela, pontuando que não acredita em aumento do valor dos imóveis, por uma própria autorregulação do mercado.
A secretária ainda cita que há previsão de um prazo de adaptação ao novo Plano. “Depois de aprovado, teremos seis meses até sua aplicação. No primeiro ano, a outorga onerosa terá desconto de 50%, no segundo de 30% e no terceiro de 20%”, adianta ela, sustentando que, assim, proprietários de loteamentos poderão se adequar ao novo modelo.
Maria Caldas acredita que, se aprovado, nos anos seguintes o que se vai se ver é o aumento da oferta de venda de imóveis e lotes e, em consequência a maior oferta, uma provável redução gradual do valor. Para ela, “só não vai ser acomodado no novo regimento quem quer especular em áreas de adensamento”.
Engessamento
Para o Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB MG, Kênio Pereira, o Plano Diretor deve engessar e prejudicar o setor da construção civil. “Esse Plano continua pautado na redução do coeficiente de aproveitamento em um, isso vai gerar um grande transtorno para a cidade e irá inviabilizar a sua modernização”, critica. Para ele, a nova política praticamente inviabilizaria a substituição de casas, prédios e galpões antigos por novos projetos arquitetônicos.
O advogado acredita que as medidas propostas não vão, efetivamente, reduzir o adensamento em regiões da cidade. Ele acredita que a cobrança da outorga onerosa, ao contrário do que propõe a prefeitura, irá resultar no aumento do custo da construção, “o que será pago, obviamente, pelo comprador final”.
“Causa perplexidade propor uma lei desse parâmetro em uma economia desaquecida e com um mercado imobiliário que se move em passos lentos”, examina Pereira, que ainda acusa que a Conferência Municipal de Política Urbana, realizado em 2014, não teria ouvido setores empresariais.
Descentralização
Com a uniformização do coeficiente de aproveitamento para um, Maria Caldas sustenta que, embora haja redução, por exemplo, na área contida dentro da Avenida do Contorno, em outras regiões o coeficiente será aumentado. É o caso das proximidades de grandes corredores de trânsito, como as avenidas Antônio Carlos, Amazonas, Cristiano Machado e Anel Rodoviário.
Assim, a prefeitura espera que as pessoas fiquem mais próximas de soluções de trânsito, melhorando a qualidade da mobilidade urbana e reduzindo investimentos, por exemplo, em alargamento de vias. Além disso, a secretária garante que haverá incentivo para que o comércio se desloque para essas regiões que passariam a termaior adensamento. Nas palavras da prefeitura, a ideia é “criar novas centralidades”.