A semana no Congresso Nacional foi marcada por um esforço de Câmara e Senado para votar projetos da chamada pauta feminina, em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, celebrado na última quinta-feira (8).
Apesar da aprovação de leis voltadas para garantir mais segurança para as mulheres, ainda é necessário avançar na aplicação efetiva da legislação, disse a assessora técnica da Organização Não Governamental Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Masra de Abreu.
“Atualmente, vemos que têm aumentado os casos de violência contra a mulher, mas os equipamentos públicos têm funcionado cada vez menos. Aprovam as leis, mas, [elas] não têm efetividade na prática. Essas votações da semana da mulher surgem como se tivessem respondendo a um pedido da sociedade, mas elas não conseguem entrar na vida prática”, afirmou.
Para Masra, é necessário que haja um debate mais profundo com a instituição de um fundo de combate à violência contra a mulher para garantir recursos na implementação de políticas públicas.
“Vivemos um processo de violência institucional estruturante, então, é necessário que haja a sensibilização e capacitação de servidores. Se não tivermos isso, é chover no molhado. Existem pesquisas e dados que mostram que a violência contra mulher é muito minimizada, se não tiver esse espaço para servidores serem capacitados é ter uma lei que não vai para a vida real”, assegurou.
Projetos aguardam sanção presidencial
Em processo mais adiantado de tramitação, dois projetos de lei aprovados pelo Senado aguardam apenas a sanção presidencial para entrar em vigor: o que torna crime o descumprimento de medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha e o que obriga a Polícia Federal a investigar conteúdos misóginos (que expressam repulsa ou aversão às mulheres) publicados na internet.
O projeto que torna crime a divulgação de cenas da intimidade sexual e a chamada vingança pornográfica foi aprovado de modo simbólico pela unanimidade dos presentes na sessão, assim como o que trata do descumprimento de medidas protetivas.
O objetivo da proposta é reconhecer que a violação da intimidade da mulher consiste em uma das formas de violência doméstica e familiar. Segundo a matéria, estão sujeitas à reclusão de dois a quatro anos as pessoas que oferecerem, trocarem, distribuírem ou exibirem – por qualquer meio audiovisual – conteúdos com cena de nudez ou ato sexual de caráter íntimo sem a autorização dos participantes.
O segundo projeto aprovado pelo Senado inclui na legislação de crimes interestaduais ou internacionais a prerrogativa da Polícia Federal para apurar infrações relacionadas ao tema. Ao propor o projeto, a senadora Luizianne Lins (PT-CE) argumentou que as polícias estaduais não têm condições materiais para coibir e investigar crimes cometidos na internet.
Câmara aprova seis projetos prioritários da bancada feminina
O plenário da Câmara aprovou seis projetos definidos pela bancada feminina como prioritários. A sessão foi conduzida por deputadas em uma homenagem ao Dia Internacional da Mulher.
Das medidas aprovadas, quatro projetos de lei ainda precisam ser apreciados pelo Senado para entrar em vigor. Os temas votados buscam assegurar mais rigor na punição dos crimes de estupro, abuso em transporte público e outros de natureza sexual. Além disso, abordam a perda do poder familiar, a garantia de gestantes continuarem os estudos e ainda a criação de um comitê para tratar de assédio na Câmara.
Pelo projeto de lei 5452/16 foi instituído o crime de divulgação de cenas de estupro e aumentou a pena para estupro coletivo. O texto, de origem do Senado, foi alterado para punir com reclusão de um a cinco anos quem oferecer, vender ou divulgar – por qualquer meio – fotografia, vídeo ou outro tipo de registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável.
O projeto inclui ainda o crime de importunação sexual, prática de ato libidinoso na presença de alguém sem concordância dessa pessoa.
Atualmente, o Código Penal prevê como ato libidinoso e enquadra como contravenção penal, punindo apenas com multa, pessoas que se masturbam ou ejaculam em transportes públicos, por exemplo. O projeto de lei também prevê aumento de pena de metade a dois terços se o crime resultar em gravidez.
No caso de o criminoso transmitir doença sexualmente transmissível que sabe ser portador, ou se a vítima for idosa ou pessoa com deficiência, a pena será ampliada de um terço a dois terços.
Já o projeto de lei 2350/15 aumenta o período do regime de exercícios domiciliares a que têm direito as estudantes grávidas. A partir do oitavo mês de gestação e até seis meses após o nascimento da criança, a estudante de qualquer nível ou modalidade de ensino, grávida, em fase puerpéria (até 45 dias após o parto) ou lactante fica assistida pelo regime de exercícios domiciliares.
Em casos excepcionais, comprovados mediante laudo médico, o período de repouso poderá ser aumentado, antes e depois do parto, sendo a estudante incluída no regime de exercícios domiciliares.
As instituições de ensino também deverão ter suas instalações físicas adaptadas, além de promover medidas para acolher adolescentes grávidas, em estado de puerpério ou lactantes.
Projeto estabelece perda do poder familiar
O plenário da Câmara aprovou ainda o projeto de lei 7.874/17, que estabelece a perda do poder familiar (do pai ou da mãe) em caso de feminicídio, de lesões gravíssimas e abuso sexual contra filhos.
O texto sobre o feminicídio estabelece que perderá o poder familiar aquele que praticar, contra o outro titular desse mesmo poder, crimes como homicídio, feminicídio ou lesão corporal grave ou seguida de morte, nos casos de crime doloso e que envolverem violência doméstica familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
A medida também prevê a perda do poder familiar para quem cometer estupro ou outro crime contra a dignidade sexual.
Esteticistas e cosmetólogos
Na sessão em homenagem às mulheres, também foram aprovadas a regulamentação da profissão de esteticista e cosmetólogo. A medida prevê a exigência de profissional com diploma de graduação em curso de nível superior com concentração em estética e cosmética.
A fiscalização da profissão, segundo a proposta, será definida em norma a ser preparada pelo Poder Executivo. Dos projetos de lei aprovados na Câmara, este é o único que segue para sanção presidencial.
Registro de Câncer
Também foi aprovado o projeto de lei que torna obrigatório o registro compulsório de eventos de saúde relacionados ao câncer, como mecanismo para garantir que seja cumprida a lei 12.732/12, que estabelece prazo de 60 dias para o início do tratamento. A matéria também foi encaminhada para apreciação do Senado.
Comitê contra o assédio
Já promulgado após a votação, o Comitê de Defesa da Mulher contra Assédio Moral ou Sexual, no âmbito da Câmara dos Deputados, foi instituído para analisar e encaminhar às instâncias competentes denúncias de assédio moral ou sexual feitas por servidoras efetivas, comissionadas, terceirizadas, estagiárias, deputadas e outras mulheres visitantes da Câmara. Para o encaminhamento, a denúncia deverá ter fundamento.
Segundo a deputada Laura Carneiro (MDB-RJ), a resolução é uma forma de inibir o assédio sofrido no ambiente de trabalho.