Reportagem: Mateus Parreiras / EM
UBERLÂNDIA, TRIÂNGULO MINEIRO – Uma rotina de tensão e de juras de retaliação pesa sobre os mais combativos promotores de Justiça de Minas Gerais, que não se abatem pelas ameaças e atentados, continuam acumulando inimigos e precisam de segurança para trabalhar. O promotor da Vara da Infância e da Juventude de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, Jadir Cirqueira de Souza, de 54 anos, por exemplo, já recebeu tantas ameaças que está escrevendo um livro sobre o assunto. “Todo promotor precisa ter uma consciência e uma rotina que o torne precavido. Mas no interior a exposição é maior e a segurança menor. Um pistoleiro que entrar no Fórum ou na procuradoria para me matar vai encontrar pouca resistência, sobretudo seguranças de firmas particulares”, considera. Ele tem proteção policial para ir ao trabalho e para sua família, depois de ter recebido, no fim do ano passado, várias ameaças de morte pelas redes sociais e de uma multidão o ter cercado no Fórum de Uberlândia. “Foi uma manifestação direcionada e só escapei porque a Polícia Militar estava lá. Tive de sair pelos fundos e me afastar das minhas funções até as coisas se acalmarem na comarca”, lembra.
O cerco ao promotor de Justiça ocorreu em novembro do ano passado, durante as ocupações de escolas públicas em todo o país para impedir mudanças no sistema de ensino nacional. Jadir conta que vinha negociando com representantes dos estudantes até descobrir que lideranças políticas estavam manobrando os alunos das ocupações. “Foi então que determinei que os pais tirassem seus filhos dessas ocupações e os alunos voltassem às aulas. Mas precisei voltar atrás quando recebi as ameaças e a situação do ponto de vista de segurança ficou perigosa”, afirma.
Manifestantes cercaram o Fórum fazendo ameaças aos gritos e com buzinaço, obrigando o promotor a sair pelos fundos, escoltado pela PM. “Precisei deixar meu carro no estacionamento e ir embora. A PM estava lá acompanhando outro caso sobre crime organizado e por isso puderam me escoltar para fora”. Deixar o Fórum não pôs fim aos riscos e o promotor precisou receber segurança e se afastar. “Tive de ficar uma semana afastado, no Maranhão, até tudo esfriar. Ainda assim estou com escolta e pessoas da segurança institucional que me municiam de informações sigilosas para minha segurança”, disse.
O desgaste dessa vigilância na vida particular do promotor ainda é grande. “Impacta a família, os amigos, os vizinhos. Os meus dois filhos viam quando eu chegava com a escolta de vigilância disfarçada, com aqueles carros descaracterizados, mas com luzes da polícia acopláveis. Isso mudou o esquema de segurança do meu condomínio. Tive de explicar também todo esse desgaste aos meus filhos. Temos de viver com esses traumas”, afirma.
GARIMPO A pior ameaça, contudo, ocorreu em Coromandel, no Alto Paranaiba, em 1996. “Fizemos uma operação contra garimpeiros que desviaram o curso do Rio Paranaíba para retirar diamantes do leito. Acompanhei a operação com a PM e tivemos 50 presos. Como a cidade vive do garimpo, o impacto foi muito grande”, diz Cirqueira. Após a operação o promotor passou a receber ameaças e precisou ficar dois meses com escolta ostensiva.
Mas a situação se agravou. “Uma mulher foi até a minha esposa e contou a ela que um dos garimpeiros presos estava inconformado e que tinha contratado um pistoleiro de Brasília para me assassinar. Foi preciso manter essa escolta e sair da cidade com a família”, diz Jadir Cirqueira. Além dos procedimentos institucionais, que lhe garantem vigilância, o promotor também toma medidas por conta própria. “Era fuzileiro naval antes de entrar para o Ministério Público e como militar sei lidar um pouco com essas situações. Também fiz aulas de defesa pessoal, com prática de caratê”, afirma.