Aos 500 anos, completados em 2016, a cachaça ainda não encontrou o seu espaço no mercado internacional e
enfrenta dificuldades para manter o crescimento no segmento premium, destaque do setor nos últimos anos.
Criada em 1516 em um engenho na feitoria de Itamaracá (PE), a cachaça fez um voo de galinha na exportação.
As exportações caíram 27% em receita e 17% em volume no ano passado, segundo dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior). A receita, de US$ 13,32 milhões em 2015, foi a menor desde 2007.
Apesar de os EUA (segundo principal importador) terem reconhecido oficialmente a cachaça como genuinamente brasileira, a bebida ainda não decolou no exterior devido à falta de investimentos em promoção, segundo fabricantes.
“As exportações cresceram em anos anteriores porque o Brasil estava na moda. Mas o produto é um mero desconhecido lá fora”, diz Maria das Vitórias Cavalcanti, diretora de relações internacionais da Pitú, uma das maiores exportadoras do país. Apenas 1,2% do volume de vendas da empresa vai para o exterior.
O pico da exportação ocorreu em 2014. A Copa no Brasil estimulou o interesse pela bebida, mas o setor não conseguiu manter o resultado, mesmo com a ajuda do câmbio.
“Para ser player mundial, é preciso investir”, diz César da Costa Rosa, presidente da Velho Barreiro, em que as exportações representam 3% do negócio. Estudos da companhia mostram que seria necessário um investimento de US$ 110 por ponto de venda no exterior para a cachaça começar a participar do mercado mundial de destilados.
“O setor, sozinho, não tem caixa para fazer isso”, afirma.
O Brasil produz 800 milhões de litros por ano de cachaça, ou 4% do mercado global de destilados, segundo a Euromonitor. A exportação não chega a 2% da produção.
BRANQUINHA
A cachaça embarcada é a “branquinha”, para elaboração de caipirinhas. Tem baixo valor agregado. Mais da metade é exportada a granel, e são poucos os fabricantes da bebida envelhecida que se dedicam ao mercado externo.
A gaúcha Weber Haus é uma delas. Cerca de 35% do faturamento da empresa, dedicada ao segmento premium e de orgânicos, é proveniente de exportações. “O setor ainda está sendo descoberto no mundo. Estamos trabalhando para divulgar a cachaça como opção de consumo em doses”, afirma Evandro Weber, sócio-diretor.
Apesar de reconhecer os esforços recentes da Apex (Agência de Promoção às Exportações), as empresas afirmam que é preciso mais. Defendem que o governo vista a camisa da cachaça como produto típico nacional.
As críticas se referem não só à promoção da bebida no exterior como ao sistema tributário, que estimularia a informalidade –situação que abrange 85% dos produtores, segundo o Ibrac (Instituto Brasileiro da Cachaça).
Sob o ponto de vista do comércio exterior, a Apex afirma que houve pouco tempo para que suas ações se convertessem em números –o trabalho da agência com o setor teve início em 2012.
Segundo Cristiano Braga, gerente de exportação da Apex, o governo investiu R$ 5 milhões nos últimos anos para promover a cachaça. Mas ele diz que dinheiro não é tudo. “A expansão depende também da capacidade de organização do setor.”
A tequila mexicana, cuja exportação supera US$ 1 bilhão por ano, é citada como exemplo por produtores.
Mas o presidente do Ibrac, Carlos Lima, diz que o avanço da bebida está relacionado à organização do setor. “O governo deu autonomia ao conselho regulador da tequila, uma instituição privada, que se autofinanciou. Precisamos de algo semelhante.”
AUMENTO DE IMPOSTO
A principal queixa do setor hoje é a tributação. Em dezembro, houve alta do IPI, que passou de até R$ 2,90 por litro para uma alíquota de 25% sobre o valor final do produto.
A medida afeta principalmente o mercado premium. O IPI sobre uma garrafa de R$ 50 foi de R$ 2,90 para R$ 12,50. “Vamos ter de reduzir produção e pessoas e parar de investir”, diz Weber.
Para Lima, o aumento de impostos pode atrapalhar o desenvolvimento desse segmento, o único que vinha crescendo no país. Em 2015, até agosto, as vendas totais de cachaça caíram 4% em volume, segundo a Nielsen. Em valor, houve aumento de 7%. “É um sinal de que o público está valorizando mais a qualidade”, diz Jairo Martins, especialista em cachaça.