Uma área de 85 hectares (ha) do Rio Pará, que daria quase três parques municipais Américo Renné Giannetti, no Centro de Belo Horizonte, deixou de ser mata ciliar e se transformou em cinzas, plantação ou eucaliptos. É o que mostra levantamento a partir de informações de satélites compilados pela Organização Não-Governamental World Forest Watch, de 2017 a 2021, levando-se em conta margens de 50 metros de cada lado do rio (confira o quadro). O espaço dá uma ideia de como o desmatamento afeta o manancial, que é o quarto maior contribuinte do Rio São Francisco em Minas Gerais, mas é subdimensionada, já que onde o rio é mais largo, acima de 50 metros, essas margens protegidas devem ser de 100 metros.
"O desmatamento é um dos grandes problemas, não só por remover um habitat importante para os peixes e animais, mas também por conter o assoreamento", indica o presidente do Comitê da bacia Hidrográfica do Rio Pará (CBH Rio Pará), José Hermano Franco. "Tivemos dois anos bons de chuvas, mas precisamos continuar com ações importantes junto aos municípios, o estado e os cidadãos para proteger as nascentes, matas ciliares, melhorar a quantidade e a qualidade da água", afirma o presidente do CBH Pará.
Desde segunda-feira, o Rio Pará recebe uma expedição que percorre da sua nascente, em Resende Costa, nos Campos das Vertentes, até a foz, entre Martinho Campos e Pompéu, no Centro-Oeste mineiro. São 365 quilômetros para denunciar a devastação ambiental, problemas de saneamento, mas também o orgulho e as belezas das paisagens paraenses. Ontem, a expedição esteve em Itaguara, na Grande BH, no distrito de Pará dos Vilelas. A programação conta com visita técnica ao Pontilhão e à Igreja de Nossa Senhora da Conceição, às margens do Rio Pará, apresentações artístico-culturais e do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) local. Hoje (10/05), a parada é em Pará de Minas.
O ano de 2019 foi o pior no período entre 2017 e 2021, com a perda de 36 ha de cobertura arbórea na área ciliar, seguido por 2021, com 18,5ha. O trecho mais desmatado, com quase a metade do somatório, chegando a 41ha, fica dentro do município de Carmo do Cajuru, incluindo os arredores da represa de mesmo nome. Em 2021, último ano de análise dos dados de desmates nas matas ciliares do Rio Pará, o trecho perdeu 9ha.
Quem desmata as matas ciliares, consideradas Áreas de Preservação Permanente (APP), está sujeito a penas previstas na Lei nº 12.651/2012, que instituiu o novo Código Florestal brasileiro, como multa de R$ 5 mil a R$ 50 mil por hectare, restauração da área, embargo de atividade, suspensão de créditos, proibição de acesso a incentivos fiscais, perda ou suspensão de direitos, como o direito de participar de licitações públicas. Além disso, o desmatamento pode configurar crime ambiental, previsto na Lei nº 9.605/1998, incluindo prisão de um a três anos, além de multa.
A perda de vegetação ciliar é um dos problemas que impulsionam o assoreamento das águas de um rio segundo indicações do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (Icmbio), com as chuvas carregando sem barreiras todos os detritos das enxurradas para dentro do manancial. Com isso, o rio se torna mais raso e seca com mais facilidade, o que pode provocar problemas de abastecimento.
Dois pontos da bacia hidrográfica já se encontram com declaração de conflito pela utilização de recursos hídricos: o Rio Picão e Ribeirão Paciência (afluente do Rio São João, que, por sua vez, é afluente do Rio Pará), informou a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).
De acordo com análise feita pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), o Rio Pará atravessa regiões de baixa oferta hídrica para a população e as atividades econômicas. Principalmente a área do Córrego do Barreto, em Nova Serrana (muito crítica), Rio São João, em Itaúna, Igaratinga, Pará de Minas, Conceição do Pará, Onça de Pitangui e Pitangui (muito crítica), Rio do Peixe, entre Divinópolis, Pompéu e Dores do Indaiá (crítica/muito crítica), Ribeirão da Paciência (muito crítica), Rio Pará entre Nova Serrana e Conceição do Pará (preocupante), Rio Pará entre Conceição do Pará, Pitangui e Leandro Ferreira (crítico), Rio Pará entre Pitangui, Martinho Campos e Pompéu na sua foz (Preocupante).
Na foz dabacia hidrográfica do Rio Pará, a vazão corresponde a 31 m³/s e o percentual outorgável é de 30% deste valor, informa a Semad. "Atualmente, a demanda de água na bacia é aproximadamente 12 m³/s, considerando as outorgas em barramentos de acumulação que regularizam a vazão. Apesar de não ter problemas com disponibilidade hídrica na calha do Rio Pará, pode-se dizer que a tendência é uma maior utilização de vazão, devido ao aumento de outorgas em seus afluentes (ex: Rio Lambari) para o uso de irrigação", informa a secretaria.
COMBATE As fiscalizações realizadas pela Semad e pela Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) são formas de coibir o desmatamento de áreas protegidas, como as matas ciliares. "Quando a fiscalização identifica atividades irregulares, são tomadas medidas necessárias para interromper a operação, com aplicação de multas, suspensão das atividades e apreensão dos equipamentos utilizados. Desde 2016 temos registradas 1.557 fiscalizações de combate ao desmatamento e 545 fiscalizações de atividades potencialmente poluidoras, englobando atividades industriais, mineração, tratamento e destinação de esgoto e resíduos, entre outras", informa a secretaria.
No que se refere às ações de preservação e fomento, incluindo a Bacia do Rio Pará, o Instituto Estadual de Florestas (IEF) informa ter ações que envolvem desde a oferta de assistência técnica até a doação de mudas e insumos. O IEF tem 47 viveiros de produção de mudas. (MP)