Enquanto a maior parte dos parlamentares do Congresso Nacional foge de temas polêmicos que podem colocar em risco suas reeleições, o deputado tucano Rogério Marinho (PSDB-RN) age de forma diferente e assume as missões do Palácio do Planalto de relatar algumas das alterações legislativas impopulares do presidente Michel Temer. Aos 54 anos, em seu terceiro mandato em Brasília, relatou por exemplo a reforma trabalhista e a revisão dos planos de saúde, cuja fase final de tramitação foi adiada duas vezes.
No momento em que o futuro da relação dos tucanos com o Planalto está sendo discutido, ele defende o apoio da bancada à reforma da Previdência e a formação de uma candidatura única de centro liderada pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e apoiada pelo Planalto. “A centro-direita ainda não está ocupada. De um lado há o Bolsonaro (deputado federal pelo PSC no Rio de Janeiro) e de outro o Lula (ex-presidente da República). A ocupação será feita a partir da consolidação de uma candidatura unificada, até com apoio de outros partidos da base.” Sobre a reforma da Previdência, diz: “O momento agora é de apoiar a agenda que nós propusemos ao governo federal. Eu mesmo vou votar a favor. A maioria entende que o apoio independe de posição no governo.”
Para Marinho, defender a reforma da Previdência não representa uma dificuldade como para muitos de seus correligionários. Ele relatou a reforma trabalhista, que provocou a ira dos sindicalistas ao extinguir o imposto sindical obrigatório, ideia da qual Marinho não cedeu. Enfrentou em razão disso cerca de 10 mil pessoas, segundo seus cálculos, em protesto na porta de sua casa em Natal.
Já seu relatório sobre planos de saúde o transformou em adversário de entidades de defesa do consumidor. O texto, ainda passível de mudanças, está na comissão especial que discute a revisão das regras dos planos de saúde. “Tanto na reforma trabalhista quanto nos planos da saúde estamos legislando em favor da sociedade, não há nenhuma amarra a esse ou àquele seguimento”, alega.
Ele propôs, entre outros pontos, limitar multas aplicadas às seguradoras e alterar o Estatuto do Idoso, autorizando os reajustes nas mensalidades dos planos médicos após os 60 anos de idade. Na reforma trabalhista, pegou um texto que mexia em quatro artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e entregou um que alterou mais de uma centena deles.
Agora, candidata-se a relatar a Medida Provisória 808/17, que Temer publicou e enviou ao Congresso para mudanças na reforma, o que desagradou ao tucano. Marinho promete trabalhar para deixar a nova lei incólume. “Uma lei dessa magnitude vai ter suas dores do parto”, diz sobre um possível desequilíbrio na relação entre empregador e empregado.
A despeito disso, admitiu ao Estadão/Broadcast Político, com certo desconforto, já ter burlado a legislação do trabalho. “Todo mundo no ramo teve que trabalhar com a informalidade”, afirma. Foi num negócio nos anos 80 de fornecimento de coco verde (água de coco), cultura com ampla produção no Nordeste. Contratava sem carteira assinada catadores que se arriscavam a trepar nos coqueiros plantados nos arredores de Natal para retirar o fruto, transportado até revendedores no Sudeste. “Era o típico trabalho intermitente, que na época não tinha cobertura Você quer se livrar do problema o quanto antes, não se sente confortável em manter o vínculo porque ele pode ser virar contra você.” O deputado considera que a rigidez da “vaca sagrada de alguns”, como se referiu à CLT, impôs que ele empreendesse na clandestinidade.
Ele também é integrante de outras comissões polêmicas, como a do Estatuto da Família e a da Escola Sem Partido. “Todo adolescente utópico sonha que o socialismo vai libertar o mundo. Até meus 22 anos tive uma militância à esquerda”, revela o economista formado na antiga Faculdade Unificada para o Ensino das Ciências, ex-professor de História e Matemática na rede estadual e hoje sócio de uma consultoria em Educação e no ramo imobiliário.
Marinho é neto do ex-deputado e advogado Djalma Marinho (UDN, Arena e PDS), que presidiu a Comissão de Constituição e Justiça no regime militar. Ingressou na vida partidária em 1993, filiado ao PSB da ex-governadora Wilma de Faria (morta em junho).
Assessorou o atual prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves (PDT), e foi secretário de Desenvolvimento Econômico no governo Rosalba Ciarlini (DEM). Por causa de uma aliança fracassada do PSB com o PT da senadora Fátima Bezerra, migrou para o PSDB em 2009 e, no racha tucano, alinhou-se ao governismo do senador Aécio Neves (MG).
Com aval do Palácio do Planalto, foi indicado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com quem possui afinidades ideológicas, para as duas relatorias – a da trabalhista a seu pedido, segundo colegas de partido. Marinho acha que pesou na escolha o fato de ter presidido a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Comércio, Serviços e Empreendedorismo. “Todo mundo sabe que sou um cara conservador na área dos costumes, e liberal na economia, com muita nitidez”, afirma o parlamentar católico.
Plano de voo
As relatorias serviram de trampolim para que Marinho deixasse o anonimato do baixo clero no plenário. Rodou o País em debates, audiências públicas e também convescotes e homenagens. Visitou a Sociedade Rural, em São Paulo, foi condecorado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e palestrou no Congresso do Movimento Brasil Livre (MBL).
Entre os colegas de bancada, corre a versão de que deseja assumir a liderança do PSDB. Ele tentará a reeleição em 2018 e acha que não corre risco de prejuízo nas urnas por ser visto algoz de sindicalistas e idosos. Marinho quer mais: “Não estou na vida pública para marcar passo”.
‘Não sou palaciano’
Nas duas denúncias contra Temer, ajudou a livrar o presidente. Conta que esteve com Temer “três ou quatro vezes” e foi parabenizado pelo trabalho de relator, mas que não possui intimidade com o peemedebista: “Não sou um palaciano”. Apesar disso, possui apadrinhados em cargos de representações federais no Estado, como um diretor na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e outro no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), recentemente afastado do posto por suspeita de corrupção.
Inquéritos
O parlamentar é investigado em três inquéritos criminais no Supremo Tribunal Federal, mas alega não se preocupar com acusações antigas que não o tornaram réu. Em suas campanhas, o deputado costuma receber contribuições de empresários e companhias do ramo da construção civil.
Em 2014, constam entre suas doações declaradas repasses de dinheiro da empreiteira Odebrecht, do banco BTG Pactual, do Café Três Corações, da Ale Combustíveis e da Guararapes Confecções (Lojas Riachuelo), cujo dono Flavio Rocha tem proximidade com Marinho e participa de debates com ele.
Recentemente, Rocha foi denunciado pelo Ministério Público por calúnia e injúria contra a procuradora regional do Trabalho Ileana Mousinho. Ela movera uma ação cobrando indenização coletiva de R$ 37,7 milhões da empresa, por irregularidades em confecções terceirizadas que prestam serviço na cadeia de produção da Guararapes. Marinho classificou a ação do MP como um “atentado” contra o emprego.