Ao menos cinco placas de “aluga-se” em apenas um quarteirão da rua Alagoas, entre a avenida Getúlio Vargas e a rua Antônio de Albuquerque, na Savassi, em BH. Quem passa pelo local – que há muitos anos perdeu a referência de luxo e glamour que tinha no fim da década de 60, como lembra a historiadora Maria Lúcia Dornas Martins – se depara com comércios fechados e lojas vazias, retrato de uma crise comercial que se arrasta há anos e se agravou com a pandemia. Entre comerciantes, funcionários e frequentadores, há uma mistura de insegurança pelos próximos meses e de expectativa de reestruturação da área.
Dentro de uma galeria, uma loja de roupas femininas instalada no local em 2018 e com encerramento das atividades previsto para o próximo dia 2 anuncia uma promoção de itens com preço máximo de R$ 99. “O fechamento tem relação com a pandemia. A loja ficou um tempo fechada, trabalhamos com o e-commerce. Infelizmente, devido a custos, alguns funcionários foram desligados”, lamenta a vendedora Victoria Fernanda de Oliveira, 23. Mas ela não perde a esperança: “Com um mercado melhor, haverá nova possibilidade de abertura”. A empresa tem unidades em outros pontos da capital.
A quantidade de lojas fechadas na região desde março de 2020 é desconhecida, inclusive pela Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH). Vice-presidente da entidade, Marco Antônio Gaspar lembra que outros pontos de BH, como hipercentro e Barro Preto, também foram muito prejudicados com a chegada da pandemia de Covid-19. E acrescenta: “Temos uma marca registrada, Viva a Savassi, para fazer o marketing das lojas. Mas até nisso estamos paralisados. Estamos com o projeto de reativação, mas sem data definida”.
Segundo ele, alguns fatores fizeram com que o movimento e as vendas ficassem menores na pandemia. “A Savassi é, talvez, a maior concentração de salas comerciais de BH. E todo esse pessoal, que faz a movimentação do local na hora do almoço, a movimentação do comércio, está de home office. A gente acredita que possa melhorar esse movimento quando os escritórios voltarem”, prevê.
O empresário Gustavo Josias Resende, 36, tem um café na área conhecida como “coração da Savassi”, e conta que o fechamento às 19h atrapalha o funcionamento. “No almoço, (o movimento) caiu 50%. No happy hour, por volta das 18h, todas as mesas ficam ocupadas. Mas agora (devido às restrições), fecha às 19h. Quando a gente fala que precisa fechar esse horário, o povo ri”, relata.
Contexto
Nem só o comércio movimentava a Savassi, lembra a historiadora Maria Lúcia. “Ir à Savassi era quase um evento. O que começa a colocar um fim nesse glamour é o surgimento dos shoppings, isso tirou muito a atenção da Savassi”, resume.
A historiadora ressaltou que a Savassi está no imaginário do belo-horizontino como um local “bacana”. “Ela é importante não só comercialmente, mas também pela questão de vida na cidade”, disse.
Frequentadores lamentam que movimento tenha diminuído
Quem passeia pela Savassi também já percebeu que a movimentação diminuiu. “Antes da pandemia, tinha muito mais pessoas, principalmente na região dos barzinhos. As pessoas ainda estão com muito receio em sair de casa, com a vacinação a gente fica mais tranquila, mas precisa manter os cuidados”, disse a fisioterapeuta Débora do Nascimento Moreira, 40, que passeava no local de ontem, com o filho de 1 ano e 4 meses e o pai, de 80 anos.
A professora de inglês Pâmela Gonçalves Rodrigues, 37, cresceu frequentando a Savassi, morava na Inglaterra, com o marido, e conta que ficou surpresa ao ver o fechamento do comércio.
“Vim para passar o Natal e o Ano-Novo com a família e, devido às restrições da pandemia, continuei aqui. Fiquei muito triste quando cheguei e vi o comércio fechado. Estava acostumada com aquela Savassi badalada, o comércio a todo o vapor. Eu fiquei pensando nas pessoas sem dinheiro, sem emprego”, afirmou, acrescentando que ficou feliz com a reabertura do comércio.
Vacinação traz alento a lojistas
Apesar da situação complicada que o comércio vive, comerciantes e funcionários acreditam em dias melhores, principalmente com a vacinação da população. É o caso da empresária Nathália Barroso, 33, que tem quatro lojas de acessórios femininos, a última aberta na praça da Savassi, em plena pandemia – agosto de 2020.
“Estamos enfrentando todas as adversidades do abre e fecha. A queda de vendas foi de cerca de 70%. Agora, se Deus quiser, a gente continuará sem o fechamento do comércio”, acredita ela.
Nathália lembra que a Savassi é muito valorizada, mas comenta que, desde o início da pandemia, houve queda brusca de faturamento. “Esperamos que o movimento volte. Com a questão da vacina se aproximando mais da gente, temos um pouquinho mais de esperança”, afirmou.
Maria Aparecida de Oliveira, 53, trabalha como consultora de moda na Savassi há quatro anos. Segundo ela, o atendimento caiu pela metade. “A gente fica na expectativa de melhora, que a vacina chegue para todo mundo e que o fluxo (de clientes) aumente. A gente sabe que a área aqui não é barata e, se fechar mais uma vez, eu não sei o que nos espera”, afirmou.
Valor
Alexandre Renault, advogado que loca imóveis em pontos de BH, disse que o aluguel de loja padrão (com 150 m²) na Savassi custa de R$ 8.000 a R$ 20 mil.
Resposta da PBH
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que não há ação específica para a Savassi voltada ao enfrentamento dos efeitos da pandemia, mas para toda a cidade. Em nota, o município informou que elaborou um pacote de 26 medidas para a retomada econômica na capital.
Entre os beneficiários, o texto cita estabelecimentos comerciais, de serviços, feirantes, bancas e ambulantes licenciados.
Leia na íntegra a nota da PBH:
“A respeito da ajuda aos comerciantes de toda a cidade, destacamos que:
Diante dos efeitos econômicos negativos causados pela pandemia da Covid-19 – que geraram a diminuição da renda das famílias e das empresas e, consequentemente, o aumento da inadimplência dos contribuintes, a Prefeitura de Belo Horizonte encaminhou à Câmara Municipal projeto de lei para autorizar o Poder Executivo a conceder aos contribuintes devedores do Município, por meio de programa específico e temporário, descontos expressivos para o pagamento, à vista ou parcelado, de créditos vencidos até 31 de dezembro de 2020.
E vale destacar que, ainda no ano passado, a Prefeitura de Belo Horizonte prorrogou, por três vezes, o pagamento das parcelas de abril a dezembro do IPTU/2020 e das taxas imobiliárias (TCRU e TFAT) cobradas com este imposto, bem como das taxas mobiliárias (TFLF, TFS e TFEP) que tinham vencimento em 10 e 20 de maio de 2020, para as empresas que tiveram suspensos os seus Alvarás de Localização e Funcionamento (ALFs) ou autorizações de funcionamento pelo Decreto 17.328, de 2020.
As datas de vencimento dos tributos foram prorrogadas até 31 de dezembro de 2021. Os tributos prorrogados poderão ser pagos em até seis vezes, a partir da primeira parcela em 31 de dezembro.
A Prefeitura de Belo Horizonte também elaborou um pacote de 26 medidas para a retomada econômica na capital: serão eliminadas, reduzidas ou parceladas taxas, preços públicos e IPTU, beneficiando 200 mil empreendedores da cidade. O valor total da desoneração será de mais de R$ 28 milhões por ano. O montante se soma aos mais R$ 201,86 milhões relativos ao IPTU e às taxas de 2020 que foram diferidos. Na lista de beneficiários estão contemplados estabelecimentos comerciais, de serviços, feirantes, bancas de revistas e trabalhadores ambulantes de rua licenciados.
A medida foi provocada pela necessidade de recuperação econômica dos estabelecimentos que foram fechados em algum momento durante a pandemia, mas terá impacto para todos os segmentos nos quais incidem as taxas e preços públicos revisados, representando menos custos para todos. Além disso, representa uma continuidade das ações de simplificação e desburocratização do ambiente de negócios na capital que, desde 2017, tem possibilitado a redução de prazos, custos e procedimentos.
A Prefeitura também encaminhou à Câmara Municipal de Belo Horizonte o projeto de lei que estabelece que pessoas físicas e jurídicas que estavam em dia com taxas e impostos de Belo Horizonte em 31 de dezembro de 2019 poderão pagar em até 60 meses eventuais débitos de 2020 – sem a cobrança de juros e multas. O projeto tem o objetivo de incentivar a regularização tributária e recuperar a atividade econômica da capital, impactada pela pandemia da Covid-19.
Na prática, significa que benefícios fiscais já concedidos a empreendimentos que tiveram suspensas as autorizações de funcionamento e alvarás de localização – como medida de controle da pandemia de Covid-19 – serão estendidos a todas as pessoas físicas e jurídicas de Belo Horizonte.
A Prefeitura de Belo Horizonte também publicou no Diário Oficial do Município, nesta terça-feira, dia 20, o Decreto nº 17.594, que prorroga para 30 de julho de 2021 o início dos prazos para pagamento ou parcelamento da Taxa de Fiscalização de Localização e Funcionamento (TFLF), da Taxa de Fiscalização Sanitária (TFS) e da Taxa de Fiscalização de Engenhos de Publicidade (TFEP) relativas ao exercício de 2021, devidas pelos estabelecimentos comerciais da capital que tiveram suspensos os Alvarás de Localização e Funcionamento e as autorizações de funcionamento.
A prorrogação destes prazos, que venceriam em 10 e 20 de maio, representará a postergação por 60 dias do recebimento de aproximadamente R$ 48 milhões. A medida vai beneficiar cerca de 63 mil contribuintes de Belo Horizonte, especialmente os proprietários de bares, lanchonetes, restaurantes, academias e cursos. O pagamento das taxas poderá ser feito em seis parcelas, até 30 de dezembro de 2021.”