Depois de 59 anos de vida pública, o senador José Sarney (PMDB-AP) comunicou nesta segunda-feira (23) à presidente Dilma Rousseff que desistiu de disputar a reeleição ao Senado em outubro. A decisão de Sarney, se levada a cabo, encerra a mais longeva carreira política brasileira.
O senador afirma que a saúde frágil de sua mulher, Marly, lhe fez optar por não concorrer mais a nenhum cargo público. Nos bastidores, Sarney confidenciou a aliados que teme não ser reeleição diante da crescente resistência ao seu nome no Amapá –onde se elegeu nos últimos anos, embora tenha construído sua carreira política no Maranhão.
O gabinete de Sarney no Senado, porém, não confirmou nem a nota, nem a decisão do senador de não disputar a reeleição. Em ocasiões anteriores, Sarney já havia anunciado publicamente sua decisão de aposentar-se, mas isso não ocorreu.
A nota diz que Sarney comunicou a cúpula do PMDB sobre sua decisão de se afastar da vida pública, mas o comando do partido diz não ter sido informado sobre o futuro político do senador.
O peso político de Sarney decaiu ao longo do governo Dilma Rousseff. Apesar de manter suas indicações no governo, a maioria das decisões cotidianas relativas à aliança PT-PMDB foi tomada pela trinca Michel Temer (vice-presidente), Renan Calheiros (presidente do Senado) e Henrique Eduardo Alves (presidente da Câmara).
Apesar do novo cenário, Sarney continuou sendo ouvido sobre questões importantes ao PMDB. Mas deixou o protagonismo que alcançou durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando presidiu o Senado e esteve no centro das decisões do país.
O ex-presidente o blindou durante a grave crise decorrente da revelação de que o Senado tinha diversas nomeações feitas por meio de atos secretos, quando o petista disse que o peemedebista não podia ser tratado como “uma pessoa comum”.
Em 2009, no comando da instituição, foi protagonista do escândalo em que 511 medidas administrativas deixaram de ser publicadas. O caso motivou dez representações contra Sarney, todas arquivadas pelo Conselho de Ética da Casa, na época controlado por aliados.
Parentes de Sarney, do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e de vários outros senadores foram contratados e exonerados da Casa por meio desse mecanismo. Apesar da crise, acabou reeleito para o Senado em 2011.
O senador ainda teve o nome envolvido nos desdobramentos da Operação Boi Barrica da Polícia Federal, que envolveu seu filho do meio, o empresário Fernando.
Presidente da República que assumiu o cargo na transição entre a ditadura militar (1964-1985) e os governos democráticos, Sarney foi deputado federal, senador e governador do Maranhão. Assumiu o comando do país por ser vice de Tancredo Neves, que morreu na véspera de tomar posse, em 1985.
Em seu governo, implantou o Plano Cruzado e viu o país ser dominado pela inflação crescente. Entregou o governo com a economia desestruturada, mas é reconhecido como um dos fiadores da estabilização política do país.
Ocupou seu primeiro mandato na Câmara dos Deputados em 1955, quando tinha 25 anos. De lá para cá, se elegeu para três mandatos na Câmara, outros quatro no Senado, além de ter governado o Maranhão.
VAIAS
Sarney acompanhou a presidente Dilma Rousseff nesta segunda-feira à cerimônia de entrega de 2.148 residências do programa Minha Casa, Minha Vida, em Macapá. Durante o evento, sofreu uma provocação do governador do Amapá, Camilo Capiberibe (PSB), que criticou as pessoas que “se aliaram” à ditadura militar (1964-1985).
O ex-presidente foi vaiado pelo público ao ser anunciado no evento. Sarney ingressou em 1965 na Arena, partido que deu sustentação ao regime militar. Pela legenda, foi governador do Maranhão (1966-1970) e senador (1971-1979).
“Existem aqueles que se aliaram aos ditadores. O Brasil não pode esquecer, porque se não, voltaremos a viver aqueles anos tristes”, disse Capiberibe.