No último sábado (3/6), os moradores do bairro São José, na região da Pampulha, se reuniram em um campo de várzea para homenagear José Milton dos Santos, de 60 anos. José, ou “Jesus” como era chamado no bairro, foi responsável por mais de 40 anos da manutenção e administração do Campo do Inconfidência, no Alípio de Melo, também situado na Pampulha.
O apelido carinhoso “Jesus” veio da aparência marcante e dos cabelos longos que possuía. No entanto, era sua dedicação para o esporte e seu cuidado com a comunidade que o tornaram amplamente conhecido e admirado por todos na região.
Evelyn Santos da Silva, de 33 anos, sobrinha de Jesus, conta um pouco da trajetória dele até chegar ao Campo do Inconfidência. “Ele veio de Sergipe, junto com o resto da família. Quando chegou aqui, se deparou com o campo abandonado e decidiu cuidar dele. Sempre foi apaixonado pela bola, então queria um lugar onde pudesse jogar com os amigos e para as crianças da comunidade, que não tem muita segurança nem lazer, terem um lugar também.”, conta.
Foi com inspiração nessa paixão que amigos e familiares de Jesus decidiram realizar a homenagem e o velório em campo. “Era a maneira mais justa de se despedir. Passou tanto tempo cuidando do campo e da comunidade. Te falo com certeza que mais de 200 pessoas foram (ao velório). Enchemos dois ônibus e vários carros com amigos e familiares, todo mundo gostava dele.”, continua Evelyn.
De acordo com Emerson Lúcio, que também trabalha na administração do campo, o velório não poderia ter sido diferente. “A vida do Jesus era o campo e a comunidade. Não tinha lugar melhor para se despedir dele, o local que ele cuidou por tantos anos e com a presença da comunidade que ele tanto ajudava também. Foi realmente a cara dele.”, afirma.
Foi justamente cuidando que Jesus acabou morrendo. O idoso caiu de uma escada enquanto realizava a poda de uma árvore no bairro Ribeiro de Abreu, na região Nordeste de Bo Horizonte, na sexta-feira (2/6). Um mês após o aniversário de 60 anos, ele não resistiu à queda e morreu no local.
No “último jogo” com Jesus, o caixão foi colocado de frente para o gol, e os companheiros de time, com pequenos toques na bola, ajudaram o amigo falecido a realizar seu último gol.
“Não tiveram como despedir dele antes, né, então surgiu a ideia do último gol para garantir que fosse uma despedida digna, juntando tudo que ele amava.”, conta Evelyn.
Depois do último gol de Jesus, a comunidade se despediu de uma figura emblemática da comunidade ao som de aplausos.
Contribuições para a comunidade
Os amigos contam sobre como Jesus retornava para a comunidade que fazia parte. “Ele tirava do bolso dele para cuidar das pessoas. Vai ser um prejuízo muito grande para a comunidade aqui.”, conta Bruce Henrique, de 43 anos, amigo próximo de Jesus.
Bruce também lembra sobre a festa que Jesus fazia no dia das crianças no bairro. “Fechava a rua, fazia um festão. Arrecadava brinquedo, arrecadava bala. Tirava do bolso dele quando precisava. A gente fazia rua de lazer para ajudar todo mundo.”, conta.
Além das famosas festas para as crianças que Jesus tanto gostava, ele também foi um dos criadores da “Pelada dos amigos”, que reunia os mais velhos do bairro para praticar o esporte.
"Ele tirou os ‘velho’ que tava entocado dentro de casa. Ele ascendeu a autoestima dos 'velhos', eles ficavam em casa, e hoje nossa pelada é muito boa, a amizade é boa demais", relata o companheiro de time.
“É impressionante o que nós aqui da comunidade conseguimos fazer por Jesus com a ajuda de todos os amigos dele. Ele merecia muito e muito mais.”, finaliza Bruce.
* Estagiária sob supervisão do subeditor Thiago Prata