“Narizinho, bota o narizinho, só o narizinho”, avisa o homem com um prato à frente da fila de detentos.
Com uma carta de rei de copas, ele junta o que sobrou do pó branco no prato de vidro e leva até o nariz de um colega, que aspira o conteúdo.
A cena foi flagrada com um celular no Compaj (Complexo Penitenciário Anísio Jobim), em Manaus (AM). O vídeo, obtido pela Folha, mostra a fila de pelo menos dez detentos em um corredor do presídio para consumir cocaína.
“É a fila do pancadão, rapaziada!”, grita um dos presos, que usam a suposta droga e, imediatamente, voltam para o final da fila para repetir o processo. “Nunca mais acaba a fila”, gritam.
Alguns escondem o rosto, outro faz um sinal como se estivesse cortando o pescoço. Há, ainda, os que riem e provocam. “Anísio Jobim, porra!”, gritam dois deles, confirmando o local da filmagem. “Acabou, acabou a zeroína'”, anuncia outro, enquanto os detentos desfazem a fila e se dispersam.
Fila da cocaína em presídeo do Amazonas
‘RECREAÇÃO’
A livre distribuição de drogas em presídios do Amazonas é uma rotina, afirma Adinaldo Matta, diretor da Associação dos Agentes Penitenciários Terceirizados. No Anísio Jobim, são eles que vigiam os detentos.
“É uma recreação deles. Os xerifes’ das cadeias às vezes distribuem essas drogas para os que não têm poder econômico e não podem comprar a droga. É uma troca de pequenos favores”, afirma Matta, que já atuou no Compaj.
“Eles fazem isso até para mostrar seu status dentro da unidade”, completa Mata.
O presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Amazonas, Antônio Jorge Santiago, diz que já presenciou cenas semelhantes.
“Já vi presos com sacolas de drogas, passando e vendendo. Mas eu estava sozinho na unidade, não podia fazer nada. Essa situação é normal nos presídios”, contou.
Em agosto, 28 agentes terceirizados que atuavam no Compaj foram afastados sob suspeita de facilitar a fuga de seis detentos, em julho. Em dois anos, 200 agentes foram afastados no Amazonas.
Em nota, a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do Amazonas afirma que o vídeo foi gravado em 2004, em outra unidade. Matta, da associação dos agentes terceirizados, diz não ter dúvidas de que o local é mesmo o Compaj.
Santiago, do sindicato dos agentes, disse o vídeo foi gravado no fim de 2013.